Folhapress/ Ana Bottallo
Uma nova pesquisa demonstrou que as sequelas pós-Covid ocorrem igualmente em adultos, crianças e adolescentes até três meses após a infecção e podem persistir por pelo menos oito meses.
Liderado pelo pesquisador Martin Roessler, da Universidade Técnica de Dresden, na Alemanha, o estudo foi o primeiro a incluir um número elevado de participantes de todas as idades para avaliar se os efeitos pós-Covid podiam ser ou não consequência da infecção pelo coronavírus.
O artigo foi publicado nesta quinta-feira (10) na revista especializada PLoS Medicine.
A pesquisa teve como base os seis principais sistemas de planos de saúde alemães, que atendem cerca de 38 milhões de pessoas (ou 52% da população). A partir dos registros de infecção pelo coronavírus, os pesquisadores selecionaram 157 mil casos de Covid (11.500 em crianças e adolescentes e 145.184 em adultos) e compararam com cerca de 1,2 milhão de pessoas no grupo controle, ou seja, que nunca tiveram a doença. Foram incluídos somente participantes com diagnóstico positivo para Covid até julho de 2020.
Cada paciente foi acompanhado por uma média de 236 dias (cerca de oito meses), no caso das crianças e adolescentes, e 254 dias (ou cerca de nove meses) no caso dos adultos. Diferentemente de outras pesquisas sobre sequelas pós-Covid, que consideram o autorregistro dos pacientes, o diagnóstico dos vários tipos de sintomas foi feito por médicos dos planos de saúde.
Todos os dados foram ajustados para condições prévias de saúde, incluindo doenças preexistentes que poderiam agravar o quadro de Covid, assim como sexo, idade e o grau de severidade da doença, uma vez que esses fatores podem influenciar na persistência de sintomas.
Foram registrados 96 sintomas divididos em pelo menos 13 grupos de sistemas, como cardíacos, vasculares, respiratórios, dentre outros. No geral, os pacientes que tiveram Covid apresentaram uma incidência 33% maior, no caso dos adultos, e 30%, para as crianças, de sintomas pós-Covid do que o grupo controle. Os problemas que apareceram com maior frequência nos dois grupos foram tosse, febre, dor de cabeça, fadiga/exaustão e dor no peito ou na garganta.
Quando separados por faixa etária, os principais efeitos pós-Covid apresentados pelas crianças foram fadiga e exaustão (128% maior), tosse (74% maior) e dor no peito ou garganta (72% mais). Já em adultos, as sequelas com maior frequência foram perda de olfato e paladar (569%), febre (233%) e falta de ar (188%).
Em crianças, foram mais comuns efeitos psíquicos e danos mentais da Covid longa, enquanto os adultos reportaram danos respiratórios e de dores no corpo com mais frequência.
Segundo os autores, apesar de os efeitos pós-Covid serem registrados igualmente nos dois grupos, a frequência foi muito maior em adultos do que em crianças. Apesar de infecções nessa faixa etária serem menos frequentes do que em adultos, isso não influenciou o resultado final, explicou à Folha Roessler.
“Uma maior incidência de Covid não iria mudar a relação entre Covid e as sequelas de longo prazo encontrada, e as altas taxas de transmissão do vírus reforçam a necessidade de avaliar sequelas pós-Covid em crianças e adolescentes”, afirmou.
Já é sabido que as sequelas pós-Covid podem se manifestar em diversas formas, inclusive no cérebro, coração, pulmões, sistema vascular e nos sistemas reprodutores. Algumas pesquisas no passado já procuraram entender melhor quais os grupos mais afetados pela Covid longa, como uma maior incidência de efeitos em mulheres.
A análise de Roessler e colegas não encontrou uma relação significativa entre hospitalização por Covid e surgimento de sequelas, embora o número reduzido de pacientes internados no estudo (5,8% em leitos de enfermaria e 2,1% para UTI, no caso de adultos, e 1% em leitos hospitalares e 0,4% em UTI, no caso das crianças) pode ter influenciado. Também não foi encontrada uma relação entre ter uma condição prévia de saúde e a maior probabilidade de Covid longa.
Outras pesquisas apontam que os efeitos de Covid podem surgir até mesmo em pacientes com quadro leve a moderado da doença, mas isso não foi possível de observar no estudo alemão.
Em relação às cepas do vírus e seu poder de provocar infecções mais graves, Roessler afirma que o estudo apresenta uma limitação principal que é ter sido feito antes do surgimento das principais variantes de preocupação (VOCs, na sigla em inglês) do Sars-CoV-2. “Como algumas dessas variantes, como a ômicron, são muito mais transmissíveis, elas podem infectar mais pessoas e, assim, os efeitos de Covid longa podem ser subestimados”, diz.
Os autores destacam a importância da vacinação para barrar ou diminuir os efeitos pós-Covid. A vacinação nas crianças de até 11 anos, inclusive, impede a chamada SIM-P, síndrome rara pós-Covid que pode trazer sequelas cardíacas nos mais novos. “O potencial de mitigação da vacinação não foi incluído no período do estudo, e assim é necessário continuar a observação a longo prazo para extrapolar nossas observações para as ondas mais recentes da pandemia”, concluem.