Jaime Leitão
A abertura dos Jogos Olímpicos de Tóquio, apesar das restrições impostas por essa terrível pandemia que ainda assola o mundo, foi belíssima e emocionante. A mensagem de paz, solidariedade entre os povos, foi transformada em um espetáculo tecnológico tocante de fazer chorar. E as tradições japonesas, como o teatro kabuki, entraram em cena, em uma breve apresentação também de uma beleza inefável.
Os drones iluminados em círculo sobre o estádio quase vazio simbolizaram um mundo que, mesmo nessa época tão angustiante, busca se recuperar utilizando os esportes como forma de transformação do horror para a beleza que não pode ser devorada nem por vírus nem por políticas extremas que violam a vida e arrasam a natureza sem nenhum pudor.
Festival de Cannes
Sábado, dia 17/7, terminou o Festival de Cannes. Conversei com o cineasta e amigo João Paulo Miranda Maria, premiado em Cannes em edição anterior do festival, sobre o filme vencedor da Palma de Ouro, “Titane”, dirigido pela cineasta francesa Julia Ducournau que, segundo ele, “faz parte de uma geração de um cinema de arte com visão mais popular, trazendo para a tela o gênero do terror com presença forte da sensualidade”.
O filme vencedor de Cannes provocou muita polêmica e deixou parte da plateia se sentindo mal, já que os filmes da cineasta tratam de temas como canibalismo e violência em uma sociedade distópica, unindo a beleza ao horror, utilizando recursos como a música e imagens desconcertantes. A arte retrata a época em que está inserida, e o cinema, por ter com todas as formas de expressão artística uma relação íntima, é capaz de chocar, de mexer com os sentimentos humanos e levar à reflexão, às vezes à rejeição, dependendo da leitura que se faça do que está sendo exibido na tela.
Beleza e horror se misturam nesse nosso mundo caótico. E a arte tem esse poder de penetrar no fundo e no labirinto da tão complexa e intricada alma humana.
Conversando com João Paulo, que reside na França, ele me deu a grata notícia de que está roteirizando o seu próximo filme longa-metragem, que deverá ser realizado na Amazônia. Apesar do horror imposto pelos inimigos da cultura no atual governo, a arte sobrevive e se manifesta, engajada em uma luta permanente pela liberdade e pela sobrevivência da democracia.
O esporte também, como a Olimpíada, pode contribuir para abrir espaço para a reflexão, em um local em que a competição, mesmo em condições tão adversas, pode acenar para mudanças.