Para quem é fã de verdade, ficar horas numa fila para comprar ingressos, debaixo de chuva ou de um sol escaldante, não é nada. Muito menos fazer outras loucuras, como viajar horas de ônibus para assistir a um show. Nada disso parece coisa fora do comum para aqueles fãs de verdade.
Nesta edição, a Revista JC Magazine mostrará a relação entre fãs e ídolos. A profissionais Ana Paula Pires Lorenzon Zumpano, psicóloga, psicopedagoga e neuropsicóloga vai explicar até que ponto essa admiração é saudável. E, claro, também tem muita emoção com histórias de rio-clarenses que são apaixonados por seus ídolos.
Para Ana Paula, ser fã, admirar algum artista ou alguma figura pública, pode ser considerado saudável quando não apresenta influência significativa na vida da pessoa, por exemplo: ouvir uma música, assistir a um show, querer conhecer alguém que você admira, pedir um autógrafo.
“A partir do momento em que se começa a idolatrar essa figura de forma desproporcional, compulsiva e radical, pode trazer prejuízos significativos para si como: ser demitido, rompimento de um relacionamento, agravo no rendimento escolar, descaracterização da sua personalidade e identidade, querendo ter as mesmas características físicas do outro, procurando cirurgiões plásticos para se parecerem cada vez mais”, explicou.
Ana Paula ressalta, ainda, que as redes sociais acabam auxiliando o desencadeamento desse fanatismo exagerado, devido à facilidade de encontrar informações sobre as celebridades, que antes eram menos acessíveis.
“Alguns fãs são tão obsessivos que acabam tendo atitudes radicais e apresentam excesso de ciúmes, perseguição ou agressão, sendo influenciados por ilusões e delírios de que essas celebridades possam estar dedicando seu trabalho especificamente para eles”, disse.
Também segundo ela, a partir do momento em que é notada uma fixação, um isolamento e uma intolerância com outros assuntos ou pessoas que não dividem a mesma opinião, é importante ficar atento.
“Indivíduos com baixa autoestima, inseguranças e sem autoconfiança podem desenvolver um fanatismo exacerbado devido à fragilidade e à necessidade de se apoiar em algo ou alguém, a fim de preencherem a incompletude de suas vidas. Vale ressaltar que aquela figura é um personagem. Atrás dele existe uma pessoa como qualquer outra, que tem sentimentos, tem bom humor e mau humor, que tem problemas e nem sempre sabe como resolvê-los, que não são perfeitos e que também envelhecem”, citou Ana Paula.
Amor à primeira vista
A corretora de imóveis Telma Penteado Ferrari, de 50 anos, tinha 14 quando ouviu pela primeira vez o cantor americano Prince – um dos artistas mais influentes da música pop da década de 1980, que venceu sete Grammys, um Oscar e um Globo de Ouro. Ela contou ao JC que foi amor à primeira vista. E pela televisão.
“Na época, em 1985, esperei acabar a música na TV para ver quem estava cantando. Pronto, foi instantâneo. A partir daquele momento, virei mega fã. Comecei a comprar os discos sem nem inglês saber, aí levava as músicas para alguém traduzir só para saber o que eles estavam falando”, comentou.
Cinco anos depois, em 1990, era anunciado o Rock in Rio II – um festival de música reconhecido como o maior do planeta, tendo sede no Rio de Janeiro. Já com 19 anos, Telma recebeu o aval da mãe para participar. E lá foi ela, junto de uma amiga, rumo à capital fluminense, onde se hospedaram no apartamento de uma outra amiga. No entanto, num dia antes do show, foram até uma boate. E, para a surpresa de Telma, seu ídolo estava lá.
“Estávamos super simples de shorts, camiseta e ao chegar [na boate], uma muvuca, afinal, o Prince estava lá dentro. Não tínhamos dinheiro, mas meus amigos fizeram uma vaquinha para eu entrar. Ele estava em cima do palco. Fui até a escada e um segurança percebeu minha movimentação. Disse a ele que era muito fã e queria conhecer o artista. Ele ficou comovido com a moça do interior. Nesse momento, o Prince desce para ir ao banheiro e passou do meu lado. Eu congelei, mas me comportei. Por isso, o segurança deixou eu subir no palco para conhecer a banda e assistir o show lá de cima. Na época não tinha celular, não levei máquina fotográfica, mas registrei esse momento no coração”, relembrou.
A corretora de imóveis afirmou que gosta de todas as fases do artista, que foi cantor, compositor, multi-instrumentista, ator e produziu dezenas de álbuns comerciais ao longo da carreira.
“Ele passou por várias fases depois que ele teve o próprio selo e a própria gravadora, ele mudou bastante e podia fazer a música que queria. O que mais me encantava nele é que tocava todos os instrumentos, mas nunca estudou com alguém. Ou seja, um talento sem igual.”
Mesmo depois de tanto tempo, Telma ainda é apaixonada pelo músico. ‘Escuto muito ainda hoje. Logicamente que tenho outra cabeça hoje. Quando menina, era maluca por ele. Quando você vai ficando mais velha… é diferente, mas gosto demais dele. Uma referência”, definiu.
Prince morreu no dia 21 de abril de 2016, há 5 anos. Ele sofreu uma overdose acidental aos 57 anos. “Muita gente que sabia que eu era fã dele mandou mensagem e me ligava perguntando como eu estava. Até parecia a viuva”, brincou.
‘Dois corações e uma história’
“E perto um do outro, a vida é diferente, a solidão dá espaço, ao amor que estava ausente. Quem olha não tem jeito, de duvidar agora, da força da paixão que tem…dois corações e uma história”. A frase foi retirada da música lançada em 2004 por Zezé Di Camargo & Luciano. A dupla, que completa 30 anos de carreira em 2021, faz parte da história de amor da rio-clarense Lílian Gomes, de 43 anos, e do seu esposo, Aurélio Ferro, de 50 anos, ambos empresários. Os dois completaram 29 anos de casados – mesmo período em que Lilian é apaixonada pela dupla sertaneja.
“Logo que comecei a namorar eu peguei para ouvir. Ele [o esposo] falava que eu não saía da cabeça dele, remetendo à música ‘É o Amor’. Aí, quando tínhamos uma briguinha de casal, cantávamos aquela música ‘Muda de Vida’. Isso só foi aumentando o amor tanto pela dupla, como pelo meu marido”, salientou.
Com pouco dinheiro na época, a empresária foi ao show da dupla pela primeira vez, em 2015, em Campinas (SP), e comprou um ingresso que dava acesso apenas à lateral do palco, que foi montado em 360 graus. No entanto, deu um jeitinho de chegar mais perto dos artistas.
“Fui passando em barreiras e seguranças e consegui chegar até a área vip, bem próxima do palco. Ficava escondendo minha pulseira porque não era da mesma cor que as demais daquele setor. Mas no fim, consegui pegar na mão deles e fazer uma selfie com o Luciano, que pegou meu celular para fotografar”, recordou.
Outra situação que a empresária citou foi que saiu de Rio Claro sozinha rumo à cidade de Paranavaí, no Noroeste do estado do Paraná, para ir em um show. Foram quase 700 quilômetros só na ida, numa viagem de mais de oito horas. Que, para ela, valeu muito a pena. “Não consegui ir ao camarim, mas fui até uma academia, onde o encontrei mais de perto.”
Na pele e no coração
Além do coração, alguns fãs decidem eternizar na pele esse amor pelos ídolos, como é o caso da operadora de telemarketing, Gabriela Quirino, de 27 anos, que acompanha um dos ruivos mais famosos do Brasil: Ferrugem – Jheison Failde de Souza.
Com vários sucessos como ‘Para você acreditar’ e ‘Atrasadinha’, gravada com o cantor Felipe Araújo, o pagodeiro conquistou o coração da rio-clarense que fez duas tatuagens em homenagem ao ídolo.
“Fiz uma igual a que ele tem na perna atrás do braço e a outra no antebraço que diz: ‘Amar como eu te amo não é para qualquer um’ – que é uma frase retirada da música ‘Caso do Amor’, de Ferrugem.”
A rio-clarense começou a gostar do ídolo em 2013 quando ele veio para uma apresentação em Rio Claro. Gabriela disse que já fez muitas coisas por ele, como ir a shows em cidades distantes e também ir atrás do músico em hotéis e em academias. E ela disse que é recíproco esse amor.
“Ele retribui com muito carinho. Em dezembro de 2020, não ia para um show pois estava desempregada. E ele disse: ‘você vai sim, vai comigo de van e vai assistir meu show do palco. Esse será meu presente de natal para você’.”
‘Incrível, original e atemporal’
Nair Helena Cerri Hebling, de 60 anos, disse que conheceu os Beatles, formado por quatro jovens de Liverpool: John Lennon, Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr, de forma tardia. Em uma década juntos, os cantores transformaram a banda em uma marca valiosa, um símbolo da cultura pop, batendo recordes de vendas e lançando músicas que são icônicas até hoje.
“Quando eu descobri, eles já não existiam mais como uma banda. Na verdade, acho que foi bom assim, pois talvez eu teria feito grandes loucuras. De qualquer maneira, me tornei aquela fã de ter todos os álbuns, CDs, DVDs, livros e consegui, felizmente, assistir a cinco seis shows do Paul McCartney e do Ringo Starr. Acho a música deles incrível, original e atemporal”, afirmou.
A médica comentou também a febre que foi o jogo ‘The Beatles: Rock Band’, em 2009. O jogo da MTV Games foi desenvolvido pela Harmonix e traz uma experiência bacana na franquia: foi o primeiro jogo musical a oferecer harmonias, desafiando o jogador a recriar os arranjos vocais dos Beatles. “A gente vê as crianças também conhecendo as músicas. Acho isso muito legal. Para quem já teve a boa chance de ver um show do Paul McCartney ao vivo, dá para notar que é uma celebração de muitas gerações. E acho isso incrível e cativante e a música deles fala ao coração de muitas pessoas. Talvez porque falam de coisas simples, de sentimentos e situações corriqueiras que acontecem na vida de todo mundo”, opinou.