História: pior tragédia no litoral norte de SP matou 500 em Caraguatatuba em 1967

Há 55 anos, Caraguatatuba foi palco da maior catástrofe natural ocorrida no país.

SALIM BURIHAN (CARAGUATATUBA, SP, FOLHAPRESS) – O cenário de destruição que se vê desde o domingo (19) nos bairros da costa sul de São Sebastião, no litoral norte de São Paulo, relembra a catástrofe que ocorreu em 1967 na vizinha Caraguatatuba, que é considerada uma das maiores tragédias naturais já ocorrida no país.

As marcas daquele desastre podem ser vistas até hoje nas encostas desmatadas que circundam a cidade.
Após vários dias de muita chuva em Caraguatatuba, as encostas, fragilizadas, deslizaram na madrugada do dia 17 de março, levando tudo o que havia pela frente, derrubando casas e soterrando moradores. A cidade ficou isolada, sem acesso, sem energia elétrica e sem água.

O município tinha 15 mil habitantes -ante os atuais 125 mil-, e cerca de 500 moradores perderam a vida.
Segundo dados do governo do estado, na época Caraguatatuba registrou em dois dias (17 e 18 de março) uma volume de chuvas de 580 mm, quantidade então prevista para seis meses.

A chuva insistente que caiu sobre a região por vários dias, provocou desmoronamento de parte da serra em direção até a cidade. Pedras, lama, terra e árvores desceram das encostas da serra em direção à cidade.

Na tragédia recente, São Sebastião registrou índice pluviométrico de 627 mm, o que provocou deslizamento de encostas, alagamentos e interdições de rodovias. Até esta terça (21), 46 mortes foram confirmadas em São Sebastião. Há, ainda, ao menos 40 desaparecidos e há 2.500 pessoas fora de suas casas, desalojadas ou desabrigadas.

Quase 56 anos depois da tragédia de Caraguatatuba, as cenas da destruição causada pelas chuvas em São Sebastião comovem e ativam a memória dos moradores da cidade vizinha.

“Chovia muito e eu estava no quarto com minha mulher, Madalena, e minhas duas filhas. Ouvíamos um barulho que parecia de trovões, mas que na verdade era provocado pelos deslizamentos das encostas. Quando amanheceu, percebemos um cenário de grande destruição”, conta o aposentado Rodoaldo Fachini, 80.

Ele tinha 25 anos na época da catástrofe. “Na manhã do dia 18 de março de 1967, quando acordamos, percebemos a tragédia que tinha ocorrido. Os morros estavam sem árvores, e pedras e lama tomaram conta de vários bairros. As ruas, em sua maioria, se transformaram em rios por onde passavam árvores, animais e destroços das casas destruídas. Uma cena difícil de esquecer.”

Mas Fachini se lembra também da solidariedade entre as pessoas e conta que Caraguatatuba recebeu ajuda de todo o país.

Até hoje, quando chove forte e durante alguns dias, a esposa dele, a professora aposentada Madalena, teme que os morros possam deslizar novamente.

“O que vemos hoje em São Sebastião, encostas que deslizaram, ruas com lama e população se solidarizando, é semelhante ao que vimos em 1967. A nossa sorte é que naquela época não havia tanta ocupação irregular nas encostas, caso contrário milhares de pessoas poderiam ter morrido.”

O músico Pitágoras Bom Pastor de Medeiros, 62, criança à época da tragédia em Caraguatatuba, disse se lembrar de ouvir estrondos e dos pedidos de ajuda de desabrigados -alguns foram acolhidos por sua família.

“Meus pais chegaram a alojar cerca de 20 pessoas, todas amontoadas, porque a casa era pequena”, disse.

E afirma que o cenário em sua cidade foi semelhante ao que se vê em São Sebastião.

“O triste, hoje, é que houve alerta da Defesa Civil, mas não tomaram as providências cabíveis, de retirar os moradores das áreas de risco. Isso poderia ter evitado muitas mortes”, disse Medeiros.

Rodrigo Montezzo: