Então candidato à Presidência da República, Jair Bolsonaro (PL) tinha apenas 16 segundos por dia no horário eleitoral em 2018. Hoje vice de Lula (PT), Geraldo Alckmin, na época postulante do PSDB, acumulava 11 minutos.
Bolsonaro terminou o primeiro turno com 46% dos votos válidos, e o ex-tucano, em quarto, não chegou a 5%. O resultado, seguido da vitória do agora candidato à reeleição no segundo turno, colocou em xeque a importância do horário eleitoral nas campanhas.
Não para para Sérgio Braga, cientista político, professor da UFPR (Universidade Federal do Paraná) e pesquisador associado do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital.
“O horário eleitoral e a televisão como um todo são muito relevantes na eleição. Boa parte da população brasileira ainda tem o hábito de assistir TV à noite”, afirma Braga, que defende a manutenção do espaço obrigatório por lei.
O horário eleitoral começara nesta sexta-feira (26) no rádio e na televisão, com dois blocos de 25 minutos cada um. Soma-se a isso 14 minutos de inserções ao longo da programação.
A propaganda no primeiro turno vai até o dia 29 de setembro. No segundo turno, serão mais três semanas, de 7 a 28 de outubro.
PERGUNTA – Com as mídias digitais e a democratização da internet ainda faz sentido ter horário eleitoral obrigatório na TV? Penso que sim. Embora não tenham a mesma importância que antes, penso que recursos de campanha como o horário eleitoral e os debates ainda têm um papel a desempenhar, por vários motivos.
SÉRGIO BRAGA – Em primeiro lugar, porque boa parte da população brasileira ainda tem o hábito de assistir TV à noite, após o trabalho, por exemplo, no intervalo entre o noticiário e as novelas, e ouvir rádio, especialmente quando estão dirigindo no trânsito. Em segundo lugar, porque os conteúdos produzidos são de maior qualidade e credibilidade, podendo ser facilmente replicado pelas redes digitais hoje em dia. É verdade também que com o impacto das tecnologias digitais as fronteiras entre período de campanha e os períodos ‘normais’ foram dissolvidas. Mas as mídias tradicionais ainda desempenham um papel muito importante no debate público.
P. – Como o senhor avalia a relevância desse espaço para a campanha?
SÉRGIO BRAGA – Elas servem para atingir um público que não é conectado às redes, tornando as campanhas mais inclusivas, e também para ‘calibrar’ a produção de conteúdo e as estratégias comunicativas das campanhas eleitorais. Não por acaso, apesar das tecnologias digitais, as elites continuam dando importância ao horário eleitoral, especialmente àqueles políticos que concorrem para cargos majoritários.
P. – Profissionais de marketing político argumentam que a eleição de 2018, onde o candidato quase sem espaço no horário eleitoral venceu o pleito, foi um ponto fora da curva. O senhor concorda?
SB- Concordo em parte. Na verdade, a internet e novas ferramentas de comunicação como a telefonia móvel, por exemplo, têm tido um papel crescente nas eleições e isso só aumenta de campanha para campanha. Além do mais, isso força os políticos a estarem o tempo todo online, envolvendo-se no que chamamos de ‘campanha permanente’. Bolsonaro não foi apenas um ponto fora da curva, embora as eleições de 2018 tenham de fato sido atípicas. Uma evidência disso é que ele [Bolsonaro] mantém grande parcela de seus eleitores. A internet tem um papel fundamental nessa manutenção de popularidade.
P. – A eleição de 2018 ficou marcada como a eleição do WhatsApp, com muita campanha e fake news compartilhadas na plataforma. O senhor vê outra plataforma com potencial para ganhar relevância na eleição?
SB – O YouTube já teve importância nas eleições de 2018. Existem estudos demonstrando que a principal fonte de material compartilhado pelo WhatsApp são vídeos do YouTube, inclusive de empresas de comunicação tradicionais. Como outros candidatos também aprenderam a utilizar a ferramenta, a vantagem competitiva do bolsonarismo nesse espaço se dissolveu um pouco. A bola da vez nessas eleições de 2022, penso eu, serão o Telegram e o TikTok, com amplo uso de impulsionamento pago, dado que o WhatsApp reduziu o alcance do compartilhamento de mensagens, inclusive campanhas de desinformação. Como o TSE também aumentou a fiscalização é provável que a qualidade dos conteúdos compartilhados melhore nessas eleições, pelo menos num período inicial, já que na reta final de campanha muitos candidatos em desespero adotam a estratégia do “vale tudo”.