Idealizador da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e catedrático influente no ensino superior público paulista nos anos 1970 e início dos anos 1980, o professor Luiz Ferreira Martins morreu na noite do último sábado (20) em Bauru, aos 85 anos. A causa da morte não foi divulgada.
Além de ter participado da criação da Unesp, foi o primeiro reitor da Universidade, dirigindo-a de 1976 a 9 de março de 1980. Sob a gestão de Ferreira Martins, em outubro de 1977, ocorreu um dos episódios mais marcantes da história da Universidade, com a invasão do Batalhão de Choque da Polícia Militar no câmpus de Botucatu para a retirada dos estudantes que protestavam de forma pacífica contra as restrições impostas pela Reitoria à atuação do Centro Acadêmico Pirajá da Silva, que representava os estudantes do câmpus.
O reitor da Unesp, professor Pasqual Barretti, decretou luto oficial de três dias na Unesp em razão do falecimento de Luiz Ferreira Martins.
O docente formou-se em Medicina Veterinária na Universidade de São Paulo (USP) em 1957 e, no ano seguinte, foi admitido como professor de histologia e embriologia na USP. Em 1959, concluiu o seu primeiro curso de pós-graduação em ciências (histologia e embriologia) e, em 1962, tornou-se doutor em ciências. Integrou o Conselho Universitário da USP por 24 anos seguidos (chegou a ser candidato a reitor) e dirigiu a Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB). Participou da criação do popularmente conhecido “Centrinho” da FOB-USP, hoje Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (HRAC), referência nacional.
Apesar da trajetória de 35 anos na USP, Luiz Ferreira Martins destacava a criação da Unesp em 1976 como o seu maior “orgulho” acadêmico e um dos maiores desafios de sua carreira, intimamente ligada à política universitária nos anos 1970, durante a ditadura militar. Em 2017, em entrevista à TV USP, o professor Luiz Ferreira Martins respondeu da seguinte maneira à pergunta “qual é o sentimento que o senhor tem em relação à USP?”.
“A USP foi onde fiz minha carreira, científica e profissional. Agora, se você perguntasse para mim qual é a coisa que considero mais importante (da carreira), é a criação da Unesp”, resumiu Luiz Ferreira Martins.
Carreira política
Três anos antes da fundação da “terceira universidade” pública estadual paulista – USP fora criada em 1934 e a Unicamp, em 1966 – Ferreira Martins assumiu o comando da Coordenadoria do Ensino Superior (Cesesp), à qual estavam vinculados os Institutos Isolados da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, reunidos para a formação da Unesp. Segundo Luiz Ferreira Martins, a decisão de criar a Unesp saiu de uma conversa dele com o então secretário estadual de educação José Bonifácio Coutinho Nogueira, que recebeu o aval do então governador Paulo Egydio Martins, morto em fevereiro passado.
Em 1979, três anos depois da fundação da Unesp, Bonifácio Coutinho Nogueira fundou em Campinas a EPTV (Emissoras Pioneiras de Televisão), rede regional de emissoras de TV distribuídas pelo interior paulista e sul de Minas Gerais, e Ferreira Martins o sucedeu na Secretaria Estadual de Educação (1979-1982), nomeado secretário estadual de educação pelo governador Paulo Salim Maluf, a quem foi fiel politicamente até a redemocratização do país.
Foi pelo antigo PDS (Partido Democrático Social), então partido de Maluf, que Luiz Ferreira Martins se elegeu deputado federal em 1982. O mandato foi cumprido entre 1983 e 1987, período em que Ferreira Martins não compareceu em 1984 à votação da emenda Dante de Oliveira (“Diretas Já”), que determinava eleições diretas para a Presidência da República, e votou em Paulo Maluf na eleição indireta de 1985 em que Tancredo Neves venceu –José Sarney, o vice de Tancredo, tornou-se presidente em março daquele ano.
Luiz Ferreira Martins foi ainda membro e presidente do Conselho Estadual de Educação de São Paulo (CEE-SP), de 1971 a 1979. Nesse período, presidiu a Comissão Estadual de Moral e Civismo e a Câmara de Ensino Superior do CEE-SP. Em 1981, foi membro do Conselho Diretor da Universidade de Campinas (Unicamp) e, quando se tornou deputado federal, assumiu a vice-presidência da Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados.
Em 1988, aposentou-se do cargo de professor da USP e se tornou, até 1991, assessor educacional da Universidade de Marília (Unimar), uma instituição privada. Depois de aposentado, também se tornou assessor na área educacional do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais, da FOB-USP, tendo participado de vários encontros e congressos de odontologia na América Latina –a FOB-USP divulgou neste domingo (21) uma nota de pesar.
Origem no interior
Luiz Ferreira Martins nasceu em junho de 1935 na zona rural de Engenheiro Hermilo, no município de Itapetininga (SP). Era o caçula de seis filhos. Estudou na zona rural até os 9 anos de idade, quando se mudou para Tietê (SP), onde moravam os seus avós e completou o ensino fundamental. Em seguida, ganhou uma bolsa de estudos e se mudou para a capital paulista, onde fez o ensino médio, antes de ingressar na USP, no Colégio Visconde de Porto Seguro, uma das escolas particulares mais tradicionais de São Paulo, com origem na colônia alemã.
Ferreira Martins teve três filhos e, desde os anos 1970, estava radicado em Bauru, cidade que lhe conferiu o título de “cidadão bauruense”. Outros 53 municípios paulistas outorgaram a ele o mesmo título, um exemplo de sua influência no interior paulista, muito em razão de sua atuação política nas décadas de 1970 e 1980.