Folhapress
“Ele foi o astro do casamento”. Assim o engenheiro químico Anderson Müller fala sobre o padre que realizou a cerimônia. Só há um detalhe: o religioso também é seu avô.
A celebração foi no dia 14 de maio, em Porto Alegre, e com a responsabilidade da bênção ao matrimônio estava o padre Paulo Müller, de 85 anos.
Além de casar o neto, ele também abençoou as alianças do próprio filho e da nora, há 27 anos, e batizou um neto e uma bisneta.
A vocação religiosa é antiga, conta padre Müller, mas só foi assumida após a morte da esposa, Lizete Müller, com quem foi casado por 29 anos e com quem teve quatro filhos.
“Desde pequeno eu ia na missa com a minha mãe e ouvia os sinos baterem. Parecia que eles estavam me chamando. Foram os sinos que me chamaram para o sacerdócio”, revela Müller.
Ele lembra que com 7 anos tentou entrar no convento, mas não foi aceito. Aos 14 anos, de novo. E mesmo aos 20, depois de sair do quartel, não conseguiu.
“Eu não tive apoio, mas não desisti. Só que quando conheci a Lizete disse a ela na hora: Você vai ser a mãe dos meus filhos. Ela ficou muito brava comigo”, recorda-se o religioso, rindo.
A moça era a nova atendente da confeitaria em que Müller trabalhava. Não demorou muito, começaram a namorar. O casamento durou 29 anos, até que a esposa faleceu após um ataque cardíaco. “Aí achei que era a hora de tentar de novo”.
Era início dos anos 1990 quando Müller foi aceito pelo seminário, no qual passou quatro anos estudando Teologia e Filosofia. “Quando me casei parei de insistir no sacerdócio, só que não desisti da igreja. A espiritualidade sempre esteve comigo.”
Nascido e criado em Novo Hamburgo, o recém-viúvo se aproximou ainda mais da igreja, que foi a mesma que ele frequentou durante toda a vida. Foi então que ele virou diácono, isto é, assistente do padre.
“Um dia fui fazer um sepultamento e não aceitaram o diácono. Então eu perguntei pro bispo se era possível eu me tornar padre. Ele foi até o Vaticano e conseguiu a autorização do papa João Paulo 2º. Foi quando eu, finalmente, consegui ir pro seminário”, conta.
Sua ordenação como padre foi em 2 de julho de 1995. “Teve muita gente que achou esquisito um homem que já foi casado, teve filhos, ser padre. Mas a igreja estava lotada. Deus me abriu espaço e eu aceitei. Me sinto feliz até hoje.”
O filho percebe que a morte da mãe foi um gatilho. “Ele não quis casar de novo e foi em busca daquele sentimento lá de trás, quando era jovem, a vontade de ser padre.”
Antes disso, fez uma reunião com toda a família. “Disse que queria fazer um comunicado e gostaria de saber a opinião de todos. Fomos unânimes em apoiá-lo.”
Paulo hoje é padre na catedral São Luiz Gonzaga, em Novo Hamburgo, região metropolitana de Porto Alegre. Ele precisou de uma autorização especial para rezar a missa do casamento do neto em outra igreja da capital.
“A cerimônia foi muito bonita. Ter ele lá deu um toque muito especial. Ele estava claramente emocionado, um misto de felicidade e nervosismo por casar o próprio neto em frente de tantas pessoas”, lembra o noivo.
Ele conta que, inicialmente, o casamento seria num espaço de festa, no entanto, o avô confirmou que só poderia rezar a missa numa igreja. “Refletimos e decidimos pela cerimônia na igreja, pois isso faria com que pessoas queridas se sentissem tão felizes quanto nós. E o vô foi o primeiro a receber o convite da cerimônia religiosa.”
A mesma emoção sentiu o tio de nderson, o gerente comercial Daniel Müller, em 1996. “O pai tinha acabado de se ordenar padre e celebrou nosso casamento, abençoando as alianças que eram dele e da minha mãe. Foi um turbilhão de sentimentos”, conta o filho. “Foi um comentário só na igreja, que tem uma história na nossa família. Foi lindo!”
O padre, conta o gerente, sempre foi um ótimo pai. “Ele nunca deixou de cuidar de nós. Só quando a gente já estava seguindo nosso caminho, ele resolveu seguir o dele. O sacerdócio é combustível para ele.”