‘Soul’ ganha lugar na história com protagonista negro e muita música

THALES DE MENEZES
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – De um modo simplificado, a definição de um desenho animado para crianças poderia ser esta: cor, barulho, personagens fofos, músicas divertidas e trama movimentada. Nesses parâmetros, “Soul” poderia ser uma animação infantil. Mas isso não é verdade.
A nova produção dos estúdios da Pixar é qualquer coisa, menos infantil. Claro que deve entreter os pequenos, mas não será surpresa se os pais ficarem de olhos grudados na tela enquanto os filhos perdem o foco para brincar.
“Soul” conta a história de Joe, o primeiro protagonista negro de um desenho da Pixar, ineditismo que já bastaria para eternizar o filme. Resumindo: ele é um professor de música que sonha em ser uma estrela do jazz. Aí ele morre, assume uma forma etérea e vai parar num lugar repleto de criaturas parecidas.
Por acidente, Joe entrou na dimensão em que as almas, antes de nascerem em corpos humanos, aprendem lições e desenvolvem as personalidades que terão na Terra. Ele quer voltar à vida e, na tentativa, acaba se envolvendo com 22, uma alma que ainda não está convencida a nascer.
Colocando lado a lado um personagem que deseja voltar à vida e outro que não quer começar a viver, o roteiro é um prato cheio para discussões filosóficas e existenciais. E isso se desenrola embalado por muito jazz. Entre papo cabeça e música, mesmo bons momentos de comédia e emoção não fazem o filme ter uma ligação direta com as crianças menores, mas isso não é um problema.
O desenho tem muito de “Divertidamente” (2015), dirigido pelo mesmo Pete Docter que assina “Soul” ao lado do roteirista Kemp Powers. Os filmes são exemplos de uma vertente cada vez mais intensa nas animações: mundos imaginários que existiriam em paralelo ao real.
Em “Soul”, são as almas, num ambiente que lembra uma escola. Em “Divertidamente”, são as emoções, transformadas em personagens que comandam cada pessoa de dentro do cérebro, em uma sala de controle.
Outro filme dirigido por Docter bebe na mesma fonte: o estupendo “Monstros S/A” (2001), em que os seres que assustam criancinhas são operários de fábricas de sustos.
Mas a origem da proposta certamente veio de “Toy Story” (1995), que buscou seus personagens no fundo do armário de brinquedos.
Dentre os filmes citados, “Soul” é o mais abertamente dirigido aos adultos e os que adoram jazz vão se encantar.
Nas vozes originais do desenho, os produtores acertaram com a escalação de Jamie Foxx, ótimo como Ray Charles na cinebiografia do músico. Além do DNA musical, o Joe dublado por Foxx tem ótima química com Tina Fey, que faz a voz do 22.
Assistir a “Soul” é mais do que diversão. O espectador tem a sensação de que não está vendo apenas mais uma animação. É um desenho com lugar na história do cinema.

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