Jaime Leitão
Há duas semanas recebi de uma prima duas fotos, uma de minha tia Cida e outra de meu tio Maurício, ambos queridos e já falecidos.
Quando abri a foto do meu tio, vi que ela se movimentava. Os seus lábios sorrindo, os seus olhos piscando; os movimentos de cabeça me deixaram impressionado de forma positiva. Há quem se assuste, fique apavorado, não se sente preparado para as surpresas que a tecnologia reserva para nós e que ainda serão muitas.
A foto da minha tia é a do seu casamento. A sua alegria me conduziu a um outro tempo, antes de eu nascer, e o passado se transformou em presente naquele momento.
O site é myheritage.com.br. A ideia inicial desse site é pesquisar a árvore genealógica dos assinantes, com direito a um pacote completo, com envio de mucosa para análise de DNA.
Não me interessei. Eu queria mesmo é ver fotos familiares, minhas também quando criança e adolescente e de autores que eu admiro: Borges, Ionesco, Drummond, dando-lhes movimento, uma expressão nova, além da imagem estática.
Os mais conservadores dirão: – é um absurdo, a fotografia é sagrada, não pode ser transformada em vídeo ou gif.
Eu pergunto: – por que não? Alguém falará: – é um desrespeito. Não acho. Muito pelo contrário. Buscar na gaveta ou no armário fotos antigas, praticamente esquecidas, e trazê-las à vida de novo em uma nova configuração, é uma espécie de homenagem, de reconhecer naqueles que nos antecederam a força desse vínculo, que por mais que fique guardado, preso na gaveta, pode ser recuperado em poucos segundos.
Meu avô, Jaime Leitão, olha para mim e em seguida sorri, nos seus oito ou nove anos, há mais de cem anos, e eu me emociono com esse contato mágico, que é um resgate de uma relação que pouco se deu enquanto ele era vivo, já que quando faleceu eu só tinha cinco anos.
Em uma foto com quatro pessoas, é possível criar quatro pequenos vídeos, com as imagens individualizadas.
Nesse momento tão difícil, trágico, viajar rumo a um tempo bem distante daqui nos faz ter uma visão ampliada do tempo, nos trazendo a esperança de que tudo melhore e que aqueles que nos antecederam e que amamos estejam bem onde estiverem.
A tecnologia tem algo de mágico, de surpreendente. Há físicos que aventam a possibilidade de o universo ser um imenso computador quântico. É uma ideia absurda. Aí eu penso: – Nada mais absurdo do que a realidade. Abro no vídeo que eu fiz do escritor genial argentino Jorge Luís Borges. Ele, apesar de praticamente cego, está com os olhos abertos, e parece enxergar muito mais do que todos nós.
O que vemos na verdade? O que não vemos? Será que existe tecnologia mais perfeita do que a da natureza, do universo, do nosso corpo e da nossa alma?