Antonio Archangelo

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Sueli Isler e o repórter Antonio Archangelo durante entrevista 

JC: Como foi sua admissão na Polícia?

Sueli: Eu já vinha trabalhando na adolescência na Chobel, balas São João e fui fazer geografia, na Unesp. Foi por acaso que fui para polícia, estava formada e dando aulas e encontrei um amigo, o José Ely Cassab e me convidou para prestar vestibular para Direito. E eu já vinha me preparando para prestar concursos e me inscrevi para o curso de direito em São Carlos e passei em primeiro lugar. Me formei em 76 na Unesp e em 77 entrei no direito. Com seis meses na faculdade, passei nos concursos de investigador, escrivão, Banco do Brasil e secretaria Estadual da educação. Como a policia civil foi a primeira que me chamou comecei a trabalhar.

JC: E como se tornou delegada?

Sueli: Foi interessante, porque era geógrafa, me formei em Direito e fui fazer mestrado na PUC/SP. Em 1982, eu terminei o mestrado em direito processual penal na PUC. Eu trabalhava na Policia Civil de Rio Claro e meu chefe, o delegado Francisco de Andrade, me dizia: não seja delegada. Vai advogar e dar aula. Faça como a Adelaide, não me lembro o sobrenome dela, ela me deu aula no Ribeiro de Geografia. E por três anos, eu acabei não fazendo concurso para delegada. Naquela época, mulher delegada não entrava. Em 1985, passei em tudo e não entrei pela prova oral, que era muito subjetiva. Fiz o segundo concurso em 1986, fiquei na prova oral. Pensei que o único jeito era passar em primeiro lugar em tudo. Em 1987, tirei em primeiro lugar na prova preambular e primeiro lugar na prova escrita. Então ficou assim, uma mulher em primeiro lugar, naquela época, é complicado. O preconceito machista imperava. E fui para segundo, por que quando chegou na prova oral todos os examinadores me deram nota mínima e acabei terminando em segundo. E nisso tudo eu vi que era meu sonho. Eu estava muito preparada.

JC: Antes de voltar para Rio Claro, onde atuou?

Sueli: Passei no concurso, fiz academia de policia, e assumi a delegacia da mulher em Avaré/SP até 1990. Em junho de 1990 assumi a delegacia de Espírito Santo do Pinhal, eu era delegada terceira classe e assumi uma delegacia de segunda classe. Comandava 40 homens e apenas duas mulheres, fiz um trabalho muito bom de combate à criminalidade. Fizemos flagrantes, diminuímos o número de furtos de veículos, e teve o sequestro no caso da menina Bruna e solucionamos. Prendemos o autor, o sequestrador do gol vermelho.

JC: A senhora ficou conhecida pela solução de crimes relacionados a morte de crianças, como foi?

Sueli: Quando foi em 1994, vim pra Rio Claro. Porque foi uma possibilidade de transferência como assistente da delegacia seccional. Após uma ocorrência de tráfico, o delegado seccional me designou para a Delegacia de Investigações Gerais (DIG) até 1997. Ai fui designada para a Delegacia de Investigações Sobre Entorpecentes. Quando fui trabalhar lá, ocorreram a morte de quatro crianças desaparecidas duas em 1996 e duas em 1997. Não se sabia a autoria, e a DIG realizava as investigações e havia suspeitas de que o autor era o Chico Vidraceiro – Francisco de Marqui – autor de mortes de crianças na cidade na década de 80.

JC: Sim, mas como chegaram ao nome do Laerte Orpinelli?

Sueli: O Gino e o Tomaz (investigadores) chegaram pela manhã e contaram que estavam num bar do São Miguel quando um pai chegou gritando que um velho estava atacando as crianças. Este idoso usava ramos de ervas verdes nas mãos e uma calca amarrada com cordão, sem cuecas e já havia mordido o pescoço de uma das crianças. Você precisa ter tino policial, não adianta ser só policial. Quando ele me falou isso, eles me disseram que levaram o homem ao plantão e acabou liberado. Eu percebi que esse poderia ser o homem. Como autoridade, que não era do caso, fiz um documento para o delegado responsável, mas o caso ficou sem solução.

JC: Não chegaram ao autor?

Sueli: Naquele ano não. Em 2000, eu assumi o primeiro distrito. O Delegado Seccional Osvaldo Galvão de França Filho me autorizou a investigar o caso. Em janeiro de 2000 estava dando aulas na Academia de Polícia. E prendemos ele em Leme. Fizemos as investigações e descobrimos que ele tinha todas as mortes, incluindo dois primos mortos na década de 90. Como cheguei em 1994 não sabia deste caso, mas ele mostrou o local onde enterrou as crianças. Aí esclarecemos a morte em Pirassununga, Monte Alto e Franca. No final das investigações, o DHPP de SP assumiu as investigações.

JC: Foi um caso revoltante?

Sueli: Sim, por mais que você tem que deixar de lado e que você não seja influenciado, não tem como não se envolver. É muito triste. Ele dizia que matar criança era como matar passarinho. Ele era uma pessoa calculista, com certo desequilíbrio. Ele tinha problemas desde pequeno, a mãe amarrava ele no pé da mesa, ficou no Sayão internado dos 13 aos 14 e foi considerado suspeito, pela própria família, de ter matado o irmão. O Orpinelli morreu recentemente de causas naturais dentro da prisão.

JC: Com esta prisão, estes tipos de casos acabaram em Rio Claro?

Sueli: Graças a Deus. Não tivemos mais crianças desaparecidas em Rio Claro e região. Foi uma bênção. Em Franca, até o DNA dele foi positivado. Muitas pessoas não acreditaram que era ele, mas eu tenho certeza que ele era o responsável pelas mortes. Foi um trabalho muito rico, com gratidão.

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