JOSÉ MARQUES
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) –
A menos de um mês do primeiro turno das eleições municipais, Campo Grande ainda tem dois candidatos oficiais a prefeito pelo PSL, antiga sigla de Jair Bolsonaro. Ambos estão em campanha e disputam o direito de aparecer na urna eletrônica quando o eleitor da cidade digitar o número do partido.
A palavra final sobre o assunto será dada pela Justiça Eleitoral, que ainda não decidiu qual candidatura é regular. Em uma situação menos provável, o Judiciário pode até barrar as duas.
O conflito que provocou essa conjuntura na capital sul-mato-grossense é recorrente em diversos partidos na campanha eleitoral.
Direções municipais, estaduais e nacionais têm entrado em guerra após o lançamento de determinadas candidaturas ou de apoios a outras legendas. As discordâncias têm acabado em litígio.
Em Uberlândia (MG), o MDB também lançou duas candidaturas à prefeitura, após um conflito entre a direção municipal e a nacional. Não foi definido quem sobrará nessa concorrência.
Mas a disputa mineira não chega nem perto, em relação à troca de acusações, da que enfrenta o PSL de Campo Grande.
Na capital, o deputado federal e presidente municipal Loester Trutis foi lançado candidato em convenção. No dia seguinte, foi contestado pela direção estadual, presidida pela senadora Soraya Thronicke, que defende a candidatura do vereador Vinicius Siqueira.
Soraya diz que Trutis tinha combinado que não seria o candidato a prefeito e só decidiu entrar na disputa porque não conseguiu encaixar uma indicada sua como vice de Siqueira. Essa indicada, afirma a senadora, vivia em Brasília e é recém-filiada ao partido em Campo Grande.
“O Vinicius não aceitou [a vice] e eu, como sou presidente nacional do PSL Mulher, identifiquei como possibilidade de uma candidatura laranja. Não tinha voto. Eu oficiei à nacional dizendo que não me responsabilizaria [pela candidatura]. Não posso julgar, mas dei todos os fatos e fundamentei a minha impressão em relação à candidatura”, afirma ela.
A presidente do PSL de MS também diz que não foram obedecidas as regras do partido na convenção que referendou o nome de Trutis. De acordo com Soraya, dos oito votantes, três eram suplentes e não podiam votar.
Sem esses três votos, argumenta, o eleito na convenção foi Vinicius, e não de Trutis. “Foi uma manobra reconhecidamente fraudulenta”, afirma.
Trutis rebate. Para ele, quem cometeu “manobra administrativa, abuso administrativo e até fraude” foi a própria Soraya e um primo dela que, por um breve período, assumiu a direção municipal do PSL e tomou decisões contrárias à candidatura de Trutis.
O deputado, que se apresenta como “PSL raiz”, diz que não houve manobra no número de votantes da convenção. “Em Mato Grosso do Sul, assim como em outros estados, a executiva do PSL é provisória e, em executiva provisória não existe a figura do suplente”, diz ele.
“Além disso, a condição de [eu] sair candidato foi um desejo da [direção] nacional”, acrescenta.
Em um vídeo nas redes sociais, Trutis expõe mensagens atribuídas a Vinicius Siqueira nas quais o vereador afirma que não queria ser candidato a prefeito, mas sim se reeleger à Câmara Municipal. Procurada pela reportagem, a campanha de Vinicius não se manifestou.
Em João Pessoa, uma briga partidária envolve o PT municipal e a direção nacional. A cúpula do partido decidiu apoiar a candidatura do ex-governador Ricardo Coutinho (PSB), mas o diretório da capital lançou o deputado estadual Anísio Maia.
Anísio toca sua campanha, inclusive com tempo de TV, enquanto o partido se movimenta para tentar impedi-la. Dois recursos ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) já foram rejeitados, mas ainda há outras ações pendentes na Justiça Eleitoral.
Na última quarta (14), a executiva nacional interveio no diretório de João Pessoa até o fim do ano, “para realizar todos os atos referentes à vida partidária no município, inclusive a participação do PT nas eleições e ações judiciais relacionadas a estas eleições”.
“A intervenção se tornou necessária para que seja cumprida a decisão anterior de apoiar a candidatura de Ricardo Coutinho (PSB) à Prefeitura de João Pessoa, que proporciona a composição de uma frente política, em defesa dos interesses do povo, da democracia e em oposição a Bolsonaro e seus aliados”, diz nota do partido. Internamente, foi decidido que não serão enviados recursos dos fundos eleitoral ou partidário para a campanha de Anísio. Em contrapartida, a direção nacional repassou R$ 60 mil para a candidatura de Coutinho.
Esse dinheiro, no entanto, só será movimentado depois que a Justiça Eleitoral definir se a candidatura de Anisio será mantida, segundo a assessoria da legenda. Se a Justiça decidir que o deputado pode continuar a disputar a prefeitura, os valores serão devolvidos ao PT nacional. Procurado, Anisio não se manifestou.
No Rio de Janeiro, o PSDB estadual interveio no diretório municipal de Niterói, que apoia o candidato Felipe Peixoto (PSD). O diretório fluminense decidiu por uma aliança com o candidato Axel Grael (PDT), sucessor do prefeito Rodrigo Neves Barreto (PDT).
A medida ia de encontro ao comportamento do PSDB local, que era de oposição à prefeitura pedetista. Os ânimos, que já estavam acirrados entre os tucanos com a intervenção, ficaram ainda mais quando foi descoberto que um dos membros da comissão interventora, que substituiria a direção municipal, é filiado ao PT.
Por causa da disputa, o PSDB chegou a aparecer no sistema de divulgação de candidaturas como coligado tanto ao candidato do PSD como ao do PDT.
O TRE-RJ (Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro), no entanto, decidiu favoravelmente ao diretório municipal. O juiz relator, Gustavo Alves Pinto Teixeira, fez fortes críticas à direção estadual em seu voto.
“Vislumbra-se frontal desrespeito ao contraditório e ampla defesa, em uma visão mais ampla, já que não houve sequer comunicação ao órgão afetado, quanto mais oportunidade de manifestação e defesa e, em uma análise mais restrita, desrespeito às normas estatutárias [do PSDB]”, disse o magistrado.
Procurado, o presidente estadual do PSDB, o empresário Paulo Marinho, afirma que recorre ao TSE.
Segundo ele, havia um acordo de o partido apoiar o vereador Bruno Lessa (DEM) à prefeitura. Mas Lessa, que era tucano antes de se filiar ao DEM, não se candidatou a prefeito e decidiu integrar a chapa do PSD como vice. Marinho diz que isso foi de encontro ao combinado, que desconhece Peixoto e que tem uma relação pessoal com o atual prefeito de Niterói.
Questionado se não era um contrassenso fazer o partido apoiar um adversário, ele diz que é o grupo de Lessa que era opositor à prefeitura. “Isso porque ele queria ser candidato. Mas essa pessoa já não está mais no PSDB, largou o PSDB para ser candidato pelo DEM”, diz Marinho.
Procurado, Lessa diz que respeita a autonomia do PSDB municipal e que o partido “optou por apoiar a principal chapa de oposição à prefeitura”.
“Esse é um conflito dele [Marinho] com o diretório local, não é comigo. Mas não acredito nessa construção partidária de uma pessoa que por cima vem, diz que manda e que fez, e se arvora sobre um partido, como se o partido fosse ele”, criticou.