Para o comerciante Kleber Ribeiro, de 46 anos, girar a chave da Ford Willys 1969 significa muito mais do que colocar o confiável motor de seis cilindros para funcionar. Cada partida na picape F-75 simboliza uma viagem no tempo, tendo seu pai como um grande protagonista em suas memórias.
“Ela é minha história, minha essência, a fonte de recordação dos melhores momentos que tive com meu pai. Ele me buscava na porta da escola com ela. E eu tinha vergonha. Mas como eu queria meu pai na porta da escola me buscando com esse carro velho. São pequenas coisas que a gente só vai dar valor depois de algum tempo”, comentou emocionado.
Aguinaldo dos Santos morreu aos 54 anos de idade, vítima de um câncer no intestino. De presente, deixou para o filho a Rural Willys, que traz a herança direta dos Jeeps militares da 2ª Guerra Mundial, num design rústico, sem folga na direção, o que exige muitas voltas de batente a batente.
Ao JC, o comerciante disse que a valente picape passou por uma reforma completa na década de 1980 e manteve a originalidade até o ano passado, quando ele resolveu colocar rodas maiores e pintar as grades de preto, para deixar o carro com um ar mais agressivo.
“Coloquei, inclusive, adesivos que são referência a datas importantes para nossa família. No entanto, não mudei sua estrutura. Se tirar as rodas, ele volta a ser como em 1969, com as devidas marcas do tempo”, relembrou.
Após mais de duas décadas abrigado debaixo de uma telha quebrada de um barracão por problemas na documentação, a relíquia tem marcas de ferrugem e um desbotamento imperceptível na pintura. No entanto, para Ribeiro, ainda não é o momento de uma outra restauração.
“Optei em fazer um bom polimento detalhado entre outras coisas como: troca de lâmpadas, reparo completo nos freios, troca óleo, substituição de rodas e pneus, mas não fiz funilaria e nem pintura. Ela traz consigo cada marca que adquiriu nesses 53 anos que está conosco”, afirmou.
Emocionado, ele contou que é capaz de falar a história de cada amassado ou risco em sua lataria. “Essa Rural é um pedaço de um grande elo que me mantém conectado a alguém que amo muito e ainda vive em minhas lembranças e lições de vida. Trocaria qualquer coisa nessa terra para ter meu pai me esperando nesse carro, nem que fosse para uma pequena volta. Assim, poderia dizer a ele o quanto seu gesto, naquele tempo, foi carregado de significados. Como tudo aquilo foi muito mais educador do que centenas de horas de aula. Sou grato a tudo que passamos juntos dentro deste automóvel e na vida”, falou.
A valente picape deixou de ser produzida em 1983 para desgosto de seus entusiastas. Mas, ao que tudo indica, o desejo de Ribeiro pode ser apenas uma questão de tempo: o carro já tem mais dois fãs, os filhos dele, que serão a terceira geração ao volante da Rural.
“Ela é um troféu das minhas lembranças. Ficaria muito feliz se meus filhos tomassem conta. Eles estariam preservando a memória do pai, mas também do avô.”