De calçado em calçado, Abimael Godoi Jr, de 57 anos, foi costurando uma história de paixão pelo legado do pai, firmando as ideias que tinha, da mesma forma que uma tachinha se firma para se prender uma sola. No Dia do Trabalhador, comemorado neste domingo, 1º de maio, ele contou ao JC sua trajetória na profissão que resiste ao tempo: a de sapateiro.

O estabelecimento é bem movimentado. Movimento tamanho que para conseguir que seu Abimael falasse à reportagem foi preciso muita paciência, em horas de plantão, por brechas no atendimento das filas constantes, na sapataria, na Rua 5.

Ele começa dando uma ideia da longevidade do ofício na família. “Estou sozinho nesta profissão desde 1986. Mas anteriormente, meu irmão estava comigo após assumirmos o negócio do meu pai, que já tinha 35 anos de casa. Ou seja, são 75 anos de ‘Sapataria Diamante’ na cidade de Rio Claro”.

No local são muitos os sapatos de saltos médios e altos, peças masculinas, femininas, infantis, assim como os calçados mais populares, distribuídos pelas prateleiras de aço que guardam centenas de pares prontos para a entrega.

Habilidade e paciência

De bigode e óculos, Abimael usa habilidades manuais, paciência e muita criatividade para consertar, conservar e até confeccionar calçados para os rio-clarenses, há mais de quatro décadas. No espaço compacto na região central da cidade onde fica instalada a sapataria, ele passa mais de 10 horas do seu dia na companhia de máquinas de costura, linhas, cola, pregos, tecidos e de duas pessoas especiais: os filhos gêmeos, que seguiram a mesma profissão do pai.

Aos 31 anos, os irmãos Abimael Godoi Neto e Guilherme Otávio chegam antes das 7h da manhã, todos os dias, para abrir as portas do negócio junto do pai. Atualmente eles realizam vários tipos de reforma em calçados diversos, tais como botas, sandálias e chinelos.

O pai não esconde que o trabalho e a família são sua satisfação. Ao longo da manhã rara de conversa, entre consultas sobre a feitura de um ou outro conserto, falou dos seus herdeiros.

“Desde pequenos eu os trazia para cá e já ensinava fazer uma pintura, encerar, limpar. É muito bom tê-los aqui. São poucas pessoas que têm a oportunidade de trabalhar em família. De vez em quando a gente discute, mas minutos depois, está tudo resolvido”.

Para o filho Guilherme Otávio, o pai é um ótimo professor . Ele diz ser encantado pela forma como seu ídolo manuseia os calçados e sempre está atento a todos os detalhes. No seu tempo, espera, ele próprio, colocar todo esse aprendizado em prática. “Ainda tenho muito caminho pela frente para chegar ao nível dele. É minha inspiração e tenho ele como exemplo para tudo na vida”, disse. 

Já Abimael Godoi Neto diz gostar muito da profissão, e mais ainda de trabalhar bem à vontade, em família. “É risada todos os dias. Às vezes umas briguinhas, mas tranquilo. Meu pai é bem exigente. Dá bronca adoidado para fazermos direito. E estamos fazendo do jeito que ele gosta e quer. Sinto muito orgulho do que ele já fez por nós e faz até hoje”.

Trio desafia avanços tecnológicos e defende tradição

O pai também diz se orgulhar pela resistência da profissão frente aos avanços tecnológicos. “Aqui não existe tanta tecnologia. É tudo artesanal, manual. A tecnologia não abala o nosso serviço por aqui. A nossa demanda tem aumentado, creio que muito devido ao preço alto dos calçados. Hoje, muitas pessoas preferem investir num sapato melhor, e se acontecer algo, mandar reformar. Essa profissão me deu tudo. Me estruturei todo com ela”, conta ele.

O filho Abimael Neto fala que abraça esse trabalho com muita vontade e determinação, para isso não terminar.  “É uma coisa muito gostosa de fazer. Me faltam palavras para descrever como é gostoso consertar algo que pertence a  alguém. Algo que tem um valor para a pessoa  e que ela não quer simplesmente jogar fora. Futuramente também quero ter filhos e incluí-los nesse lindo negócio”, declara.

Ambos os irmãos demonstram que se depender dessa relação familiar profissional, o amor ao ofício ainda vai ser transmitido às próximas gerações. “É uma ótima oportunidade estar aqui e continuar o trabalho do meu pai. Quero construir minha família para que eles, assim como eu, também fiquem aqui e levem isso para frente até onde puderem”, finaliza.

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