Folhapress

O segundo brasileiro a ir ao espaço deve fazer sua curta, mas histórica, viagem neste sábado (4). É para quando a empresa Blue Origin marcou o voo da sua missão NS-21, a quinta da companhia a levar humanos além da atmosfera terrestre.

O engenheiro de produção mineiro Victor Correa Hespanha, 28, estará a bordo graças a um sorteio conduzido entre investidores da empresa Crypto Space Agency, que adquiriu a passagem. A companhia comercializa NFTs (sigla para Non-Fungible Tokens), algo como uma propriedade única que só existe no mundo virtual.

Ele ocupará um dos dois assentos no veículo New Shepard destinados a passageiros que não bancaram seu próprio voo. Além da Crypto, que pagou a viagem de Hespanha, um dos lugares foi adquirido pela ONG Space for Humanity, que está levando ao espaço Katya Echazarreta, engenheira que já trabalhou em missões da Nasa e deve se tornar a primeira mulher nascida no México a deixar a Terra -ainda que por breve período.

A janela de decolagem deve se abrir às 10h (de Brasília), e o foguete partirá do centro de operações da Blue Origin em West Texas (EUA). Isso se a meteorologia e os sistemas de lançamento permitirem.

O voo havia sido originalmente marcado para 20 de maio, mas acabou adiado por questões técnicas.

Disse a Blue Origin em comunicado: “Durante as checagens finais do veículo, observamos que um dos sistemas de reserva do New Shepard não estava atingindo nossas expectativas de desempenho”. Em razão disso, por excesso de cautela, decidiram adiar, remarcando-o para este sábado.

O veículo New Shepard é destinado a missões suborbitais. Trata-se de uma cápsula que, impulsionada por um foguete de estágio único, é levada à borda do espaço, cruzando a chamada Linha de Kármán, a 100 km de altitude. Sem velocidade suficiente para atingir a órbita da Terra, a cápsula retorna em seguida ao chão, em um voo parabólico, e pousa com a ajuda de paraquedas e retropropulsão. Nessa jornada, seus ocupantes têm a oportunidade de observar a curvatura da Terra vista do espaço por uma das seis grandes janelas a bordo, bem como experimentar cerca de três minutos da sensação de ausência de peso, flutuando pela cabine.

O perfil do voo reproduz o realizado pelo primeiro astronauta americano, Alan Shepard, em maio de 1961. É dele, por sinal, que vem o nome da dupla foguete-cápsula.

Ao lado de Hespanha e Echazarreta, voam também, pagando as próprias passagens, o engenheiro e investidor Evan Dick (em seu segundo passeio de New Shepard, depois de ter voado na NS-19, em dezembro de 2021), o empresário de aviação e piloto Hamish Harding, o empreendedor imobiliário Jaison Robinson e o investidor Victor Vescovo.

Para o brasileiro Hespanha, é uma experiência nova e inesperada. “Acho que só vou me sentir pronto quando estiver embarcado e com o foguete decolando”, diz. “Minha família está bastante ansiosa, assim como eu. Todos animados e ansiosos. Como muitas crianças brasileiras, já sonhei em ser astronauta.”

Ao concluir o voo, ele será o segundo brasileiro a ter ido ao espaço, depois do astronauta Marcos Pontes, que voou em 2006 para a Estação Espacial Internacional. Mas são duas experiências bem diferentes; Hespanha fará um rápido voo de turismo espacial; Pontes passou dez dias trabalhando em órbita a serviço da Agência Espacial Brasileira.

CUSTOS E ACESSO

A grande novidade de missões como essa da Blue Origin é que a possibilidade de ir ao espaço começa a se abrir para pessoas que não são ultrarricas ou astronautas profissionais a serviço de governos. E a chave para isso é a capacidade de reutilizar os veículos.

Em contraste com os antigos foguetes (e mesmo a maioria dos novos), o New Shepard é totalmente reutilizável. A cápsula é recuperada e recauchutada para novos voos, bem como o lançador, um estágio único com um motor movido a hidrogênio e oxigênio líquidos. A combustão tem como resultado a emissão de água na atmosfera, e o motor se reacende próximo ao chão para um pouso suave.

A tendência é que o reúso frequente, bem como a recuperação dos investimentos iniciais no desenvolvimento do veículo, acabem por derrubar os preços e tornar a aventura espacial acessível para mais gente.

Atualmente, a Blue Origin não anuncia por quanto vende cada passagem. Em 2021, a empresa organizou um leilão para vender sua primeira passagem e a arrematou por US$ 28 milhões. O alto preço refletiu o ineditismo mais que o valor real do voo, e o leilão ajudou a companhia a levantar outros potenciais compradores, que foram procurados para vendas subsequentes. Um novo leilão realizado em maio deste ano vendeu mais um assento por US$ 8 milhões -o que reflete a queda de preços, mas ainda é bem caro.

Para efeito de comparação, a principal concorrente da Blue Origin em voos suborbitais tripulados é a empresa Virgin Galactic, de Richard Branson. Ela oferece reservas para voos a US$ 450 mil por assento, mas realizou apenas uma missão com cabine completa, em 11 de julho de 2021, e só deve voltar a voar no ano que vem.

A Blue Origin realizou seu primeiro voo tripulado nove dias depois, levando o dono da empresa, Jeff Bezos, ao lado do irmão Mark, da aviadora Wally Funk e do estudante Oliver Daemen. Mas, depois disso, não parou mais de voar. Foram realizados outros dois voos em 2021, o primeiro deles com quatro tripulantes (entre os quais o ator canadense William Shatner, 91, mais conhecido como o capitão James T. Kirk, do seriado “Jornada nas Estrelas”) e o segundo com seis.

Em 2022, o voo NS-20 levou mais seis pessoas ao espaço em março. Com ele, a Blue Origin atingiu a marca de 20 pessoas transportadas em voos de turismo espacial. Não é algo a se desprezar, já que, antes do advento das empresas capazes de realizar essas missões, apenas cerca de 400 pessoas haviam voado ao espaço.

Com a realização da missão NS-21, o número de passageiros transportados brevemente para fora da Terra pela Blue Origin deve subir para 25 (já que Evan Dick vai para o segundo voo). A empresa ainda espera realizar mais voos antes que o ano acabe.

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