FOLHAPRESS – Morreu nesta quinta-feira (24) aos 66 anos Adilson “Maguila” Rodrigues, maior boxeador peso-pesado do Brasil e um dos principais na história da América do Sul.
Ele vinha sofrendo de encefalopatia traumática crônica, também conhecida como demência pugilística, diagnosticada em 2013, e procurava minimizar os sintomas com um tratamento a base de canabidiol.
Maguila não chegou à disputa de um dos principais cinturões mundiais –embora tenha conquistado o irrelevante título da Federação Mundial de Boxe–, mas, quando se fala de carisma, teve poucos rivais entre atletas brasileiros.
Nem bem o locutor de ringue fazia o anúncio oficial de suas vitórias, ele começava a mandar abraços para todos: o açougueiro que caprichava na carne para ele ficar forte, o moço da concessionária onde comprou o carro etc. Até que o repórter era forçado a interrompê-lo.
Há controvérsias se Maguila era um sujeito genuinamente simplório ou se, sob a sua aparência rústica, habitava um gênio do marketing.
Um dos primeiros técnicos de Maguila, que viria a trabalhar com o peso-pesado no final de sua carreira, Sidney Ubeda Gomes conta que o boxeador “lia” revistas de cabeça para baixo, de propósito, só para chamar a atenção.
Gomes aponta que Maguila se divertia quando curiosos o abordavam, constrangidos, para dizer que a revista estava de ponta-cabeça.
Outro episódio, relatado por amigos e reconhecido pelo próprio boxeador, dá conta de que ele escapou de servir ao Exército, por pouco, ao fingir-se de louco.
“Ele falou que queria pegar o fuzil para dar tiro em todo o mundo”, recordou, aos risos, o ex-boxeador Mike Miranda.
Por seu tamanho, logo que chegou a São Paulo, onde moravam alguns de seus irmãos, Maguila foi aconselhado a tentar a sorte no boxe.
Foi rejeitado algumas vezes em outros locais até finalmente ter uma chance ao ser acolhido na academia do BCN, comandada por Ralf Zumbano, tio do ex-campeão Eder Jofre.
Após uma curta carreira no amadorismo, onde em termos regionais não encontrou rivais à altura, passou ao profissionalismo em fevereiro de 1983.
Após um início arrasador –conquistou o título brasileiro em sua quarta luta e o sul-americano na 11ª–, sofreu dois reveses em 1985. Foram duas derrotas por nocaute, a primeira para o argentino Daniel Falconi e a segunda para Andre Van Den Oetelaar, o “Martelo Holandês”.
O ex-campeão médio-ligeiro Miguel de Oliveira substituiu, então, Zumbano no córner de Maguila. Verdade que a fragilidade de seu queixo nenhum técnico poderia resolver, mas, sob o comando de Oliveira, Maguila passou a mostrar mais técnica, expondo-se menos nos combates.
Maguila se vingou das duas derrotas, com duas vitórias por nocaute, e sua equipe, capitaneada pelo narrador Luciano do Valle, deu início ao projeto “Mike Tyson”.
Primeiro, Maguila passou a lutar com pugilistas norte-americanos, os mesmos que boxeadores ranqueados vinham enfrentando. Até que chegou a hora de um grande teste.
O brasileiro subiu ao ringue em São Paulo com James “Quebra-Ossos” Smith, que poucos meses antes aguentara em pé 12 assaltos com o demolidor “Iron” Mike Tyson.
Foi uma luta polêmica. Os críticos acharam que Maguila mais correu do que bateu. Dois jurados viram vitória de Maguila, por 98 a 97 e 98 a 96. Um terceiro jurado, que apontou triunfo do americano, por 100 a 91, foi suspenso.
Com base em sua atividade e no trabalho de bastidores, o brasileiro foi alçado à segunda posição no ranking e entrou em rota de colisão com o ex-campeão cruzador Evander Holyfield, o primeiro do ranking, em 1989, em Lake Tahoe, nos Estados Unidos.
Após um bom primeiro assalto, em que surpreendeu o norte-americano, Maguila sofreu um violentíssimo nocaute no assalto seguinte e chegou a sofrer convulsões.
No ano seguinte, Maguila enfrentou o ex-campeão George Foreman, que voltava de uma aposentadoria de dez anos, em Nevada. Um novo nocaute no segundo assalto decretou o fim da carreira do brasileiro como sério candidato a disputa de título.
Passou a excursionar pelo interior paulista, por outros estados e até no Uruguai, contra adversários de no máximo nível mediano.
Uma derrota por nocaute para o novato Daniel Frank, que tinha apenas cinco lutas, selou a sua aposentadoria dos ringues em 2000.
O cartel profissional de Maguila, que se estendeu de 83 a 2000, inclui 77 vitórias, 61 nocautes, 7 derrotas e 1 empate.
Para o boxeador, não faltaram atividades, que começaram a aparecer antes mesmo do fim de sua carreira, durante a qual adquiriu um posto de gasolina.
Maguila foi comentarista econômico do programa popular “Aqui Agora”, participou de comerciais e, a convite do prefeito Toninho da Pamonha, aceitou o cargo de secretário de Esporte de Itaquaquecetuba, em São Paulo.
Viu ainda dois de seus dois filhos, Adenilson e Edimilson –teve um terceiro filho, Adilson Junior–, tornarem-se boxeadores profissionais, mas sem carreiras tão produtivas quanto à do pai famoso.