Fabíola Cunha
No início da noite de 20 de maio de 1994, 16 estudantes entraram em um ônibus rumo a Piracicaba e nunca mais retornaram para casa. Por volta das 18h50, o ônibus que fazia o transporte para a Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep) colidiu frontalmente com um caminhão que vinha no sentido contrário, no km 5 da Rodovia Fausto Santomauro (SP-127). Na época, o trecho de pista simples favorecia situações de grande risco para os usuários.
Além dos estudantes, outras três pessoas morreram na colisão: os motoristas do ônibus e do caminhão e o ajudante do ônibus – totalizando 19 mortes, além de vários feridos. O alto número de vítimas fatais e a violência do acidente paralisaram a cidade, na época com cerca de 140 mil habitantes. No dia seguinte, às 6h da manhã, o Velório Municipal e o Ginásio de Esportes sediaram o velório coletivo, sob os olhares incrédulos de 3 mil pessoas que passaram pelos recintos até o sepultamento, no fim da tarde.
O que se seguiu foi uma série de protestos pela duplicação e melhoria das condições da via: “Todos conhecíamos as famílias de diversos jovens que faleceram e nos sentimos como se tivéssemos perdido alguém bastante próximo”, relata o ex-deputado estadual Aldo Demarchi.
Demarchi foi uma das vozes que levaram adiante a reivindicação para que houvesse a duplicação, autorizada pelo então governador Mario Covas em 15 de março de 1997: “De início, ele resistiu, mas diante da nossa insistência, autorizou a obra, que teve início em setembro do mesmo ano, custou o equivalente a R$ 160 milhões e foi inaugurada um ano depois. É importante ressaltar a mobilização da comunidade rio-clarense na época, principalmente por meio da ‘Comissão 20 de Maio”, pontua Demarchi, que classifica a segurança atual no trecho como “acima da média”.
Atualmente, segundo a concessionária AB Colinas, que assumiu o trecho em 2000, ainda sob o nome Rodovia das Colinas, circulam cerca de 13 mil veículos por dia e é realizado o quarto ciclo de recapeamento – com investimento de R$ 37 milhões.
Estatísticas
Em 2018 a via registrou 158 acidentes, com 82 pessoas feridas e duas vítimas fatais. De janeiro até 15 de maio não houve mortes no trecho.
Docente relata a retomada da vida após tragédia
Muitas pessoas sobreviveram. Uma delas deu seu depoimento ao JC
JP Granado
O acidente na SP-127 deixou diversas vítimas fatais, porém, felizmente, algumas das pessoas envolvidas na colisão conseguiram sair com vida da situação.
Uma das sobreviventes foi Andréa Rampin, que deu o seu depoimento sobre o caso ao JC: “25 anos se passaram… Esta data continua estranha para mim. Um misto de Aniversário de Renascimento e uma lembrança de tantas perdas. Continuam nas minhas orações amigos que perdi e o pedido de conforto aos pais, familiares e amigos, que assim como eu têm a lembrança da tragédia. Foram 19 vítimas fatais, sendo 16 dessas meus amigos.
Fiquei impossibilitada de retornar para a faculdade naquele semestre – tive fraturas na coluna, pernas e na face, com procedimentos cirúrgicos por 2 anos para reconstrução do queixo e dentição. Não tenho sequelas, exceto cicatrizes. Retornei às aulas e me formei em 1998, em Psicologia. Sou docente no Senac e na faculdade Asser. Tenho uma família linda, sou casada e tenho duas filhas de 12 e 16 anos.
Integrei a Comissão 20 de Maio, que lutou para a duplicação da SP-127, a ‘Rodovia da Morte’. Usamos o lema ‘Do Luto à Luta’, com apoio político e social na época, fomos às ruas e conquistamos a tão sonhada duplicação.
Acendemos uma vela em diversos comércios e empresas da cidade e só foi apagada quando a rodovia foi entregue. Fui eu quem apaguei a vela, com sentimento de alívio por saber que nossa luta não foi em vão e respeito pelas vidas ceifadas”.
Com nome em escola de dança, família mantém memória de vítima
Estabelecimento em Santa Gertrudes leva o nome de jovem morta no acidente
JP Granado
No acidente que marcou nossa região, muitas famílias perderam parte de suas vidas, porém cada uma delas, da sua forma, mantém viva a memória das vítimas. Em Santa Gertrudes, a família Belotto colocou o nome da vítima Elizandra Belotto em uma escola de dança.
Confira o depoimento de Agnaldo Belotto, irmão de Elizandra:
“Sempre presente, é assim que nossa família sente a nossa querida Elizandra Belotto. O dia 20 de maio é uma data muito marcante, porque recebemos uma notícia muito triste. Saber que a Li saiu de casa alegre e em busca dos seus sonhos e, momentos depois, receber a informação de que ela estava entre os dez primeiros corpos reconhecidos do acidente, foi um impacto enorme para todos nós. Aliás, naquele momento todas as famílias se tornaram uma só, porque naquele ônibus que seguia para Unimep de Piracicaba estava o nosso bem mais precioso: os jovens que estavam buscando o conhecimento para seguir a carreira profissional.
A fatídica tragédia que interrompeu esses sonhos ainda é muito marcante para nossa família. Podem se passar 25 anos ou mais, tudo que acontece de bom em nossas vidas sentimos falta da presença dela. Em cada ocasião especial que existe nós pensamos em como seria se ela estivesse junto, vivenciando esses momentos.
Por ser tão querida e amar a dança, recebeu como homenagem o seu nome a Escola de Dança Municipal “Elizandra Belotto”, em Santa Gertrudes.
A cada ano que passa as memórias são cada vez mais marcantes e sem nenhuma mudança. O tempo jamais fez que sua memória fosse esquecida, pelo contrário, fazemos questão de seguir nossas vidas incluindo nossa querida Elizandra sempre presente”.