PAULA SOPRANA E ISABELA BOLZANI – SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Mesmo diante do agravamento da pandemia no Brasil, setores da economia afetados pelas novas medidas de restrição no estado de São Paulo para conter a disseminação do coronavírus receberam com resistência as regras anunciadas nesta quinta-feira (11) pelo governo de João Doria (PSDB-SP).

O segmento de restaurantes, um dos mais afetados na crise de Covid-19, voltou a criticar as restrições, justificando que falta fiscalização sobre festas clandestinas e que o transporte público é causador da aglomeração.

“Chegamos num ponto da Covid que apoiamos lockdown, mas é um apoio condicionado, desde que haja combate a festa clandestina, ao problema do metrô, ônibus e trens”, diz Percival Maricato, presidente da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes).

Para reduzir a lotação no transporte público, o governo Doria recomendou o escalonamento do horário de entrada no trabalho por setores. A indicação é que a indústria inicie mais cedo, a fim de que seus funcionários utilizem transporte das 5h às 7h. Depois, a orientação é para o setor de serviços (7h às 9h), seguido de comércio, das 9h às 11h.

A partir de segunda-feira (15), o “take away” (a retirada de produtos em estabelecimentos, sem permanência no local) fica proibido por 15 dias. Será possível apenas a retirada por automóvel (drive-thru).

Para Maricato, proibir o “take away” é uma medida não isonômica, já que os pequenos estabelecimentos, que já sofrem mais com o caixa, não dispõem de áreas para carros. “Vamos tentar intervir nisso porque o take away é drive-thru de pobre, de estabelecimento que não tem dinheiro para pagar motoboy, aplicativo, que às vezes encarece 25%, 30%”, afirma.

A estimativa da associação é que 30% dos restaurantes e bares tenham fechado as portas no país.

A ANR (Associação Nacional dos Restaurantes) emitiu comunicado nesta quinta afirmando que entende o “momento muito delicado com a expansão da Covid-19” diante da ocupação de UTIs, mas ressalta que existe uma nova onda de demissões no comércio alimentício, “que está em colapso”.

A associação pede a reedição de leis que permitam redução da jornada -uma medida do governo federal-, novas linhas de crédito com juros baixos, perdão de tributos e refinanciamento de dívidas e empréstimos. Em São Paulo, especificamente, pede a volta do regime do ICMS dos últimos anos. O tributo foi reajustado em janeiro.

No novo cenário de restrições, mercearias e padarias poderão funcionar seguindo as regras de supermercados para itens alimentícios de primeira necessidade. O consumidor poderá comprar alimentos no local, mas não permanecer ou usar as mesas.

“Contudo, os alimentos manipulados não poderão ser retirados no local, apenas autorizados para serviço de entrega (delivery)”, diz o governo do estado.

A Apib (Associação Brasileira da Indústria de Panificação e Confeitaria) pretende se reunir com autoridades para buscar negociações relativas ao pagamento de impostos.

“É um momento em que precisamos obedecer as autoridades de saúde e a ciência, mas temos que salvar os 920 mil empregos diretos no país, as padarias pequenas de bairro. Apesar de estarmos abertos, a receita chegou a cair 50% em muitos pontos”, diz Paulo Menegueli, presidente da associação.

As lojas de material de construção, que permaneceram abertas durante a pandemia com a caracterização de serviço essencial, também deverão seguir normas mais rígidas por duas semanas. O governo determinou o fim do atendimento presencial e liberou apenas a retirada por clientes com veículo ou a entrega na casa do consumidor.

“A gente entende que nossas lojas não são como parques de diversões, o cliente vai por necessidade, não é como um shopping. Vemos aglomeração nos transportes e nos bailes, que são feitos à revelia, como se a pandemia tivesse acabado”, afirma Waldir Abreu, superintendente da Anamaco (Associação Nacional dos Comerciantes de Material de Construção).

Segundo ele, o setor, que reúne 34 mil lojas no país, ficou confuso com as orientações e deve tentar negociação com o governo.

As grandes lojas, como Leroy Merlin e Telhanorte, “tomam todo cuidado porque também têm patrimônio a zelar, que a imagem corporativa”, diz Abreu.

O presidente da Abit (associação da indústria têxtil), Fernando Pimentel, classificou como “complicado” o fechamento do comércio em São Paulo. “É um mercado muito representativo. No ano passado perdemos 90, 100 dias. Agora, já temos mais 30 dias contratados de fechamento.”

O alento, segundo o executivo, vem da vacinação. Ele defende que estados e municípios adotem ferramentas de proteção às empresas no período de restrições maiores, como adiamento e abatimento de impostos e linhas de crédito.

Nas contas, de Haroldo Ferreira, presidente executivo da Abicalçados (Associação Brasileira das Indústrias de Calçados), o mercado paulista consome cerca de 40% da produção nacional. “É um momento bastante delicado. Tínhamos a expectativa de crescimento de 14% e vamos ter que revisar ao fim do trimestre”, afirma. “Sabemos do enfrentamento necessário à pandemia, mas, na nossa avaliação, vai prejudicar bastante o setor.”

Escritórios deverão impor a obrigatoriedade de teletrabalho, assim como o mercado financeiro. Em nota, o Bradesco afirmou “desde o dia 16 de março [de 2020], mais de 90% de todo quadro administrativo está em trabalho remoto e, nas agências, os funcionários estão em sistema de rodízio”.

O PagSeguro diz que também adotou o home office desde o início da crise de Covid que manterá o regime deste forma. “As novas restrições devem ter impacto em vendas presenciais. Por isso, é cada vez mais importante ajudar nossos clientes a venderem pela internet”, afirmou em nota.

O Itaú diz que fez alterações no atendimento presencial na rede de agências e que colaboradores em funções administrativas, as equipes permanecem em home office desde março de 2020.

A maior recomendação da Febraban (Federação Brasileira de Bancos) é que o cliente dê preferência ao uso dos canais digitais e telefônicos e evite ao máximo o comparecimento presencial nas agências.

NOVAS REGRAS A SETORES DA ECONOMIA PAULISTA
Escritórios (mercado financeiro, call center, jurídico, atividades administrativas, além da administração pública, do setor de telecomunicações e de tecnologia da informação): obrigatoriedade de teletrabalho

Comércio de material de construção: proibição do atendimento presencial; ficam liberados drive-thru (retirada com automóvel ) e delivery (entrega na casa do cliente)

Comércio em geral: somente delivery e drive-thru

Restaurantes e bares: somente delivery e drive-thru, com proibição de retirada de produtos no local (take away)

Mercerias e padarias: funcionam como supermercados (o consumidor compra e vai embora). Não é possível aguardar a produção de um lanche.

Podem realizar delivery
Comércio de eletrônicos: somente drive-thru e delivery, sem retirada no local

Supermercados: recomendação de escalonamento de horário para os funcionários utilizarem o transporte público para irem ao trabalho (9h às 11h)

Hotéis: Proibição de funcionamento de restaurantes, bares e áreas comuns. Alimentação permitida somente nos quartos

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