Ela tem cerca de um quilômetro de percurso da Rua 8, onde o Cristo Redentor está de braços abertos para receber qualquer um, até a porta do Cemitério Municipal “São João Batista”. Estamos falando da Avenida da Saudade. Quem passa por ela, seja de carro ou a pé, com certeza é tomado por um sentimento de transbordamento.

A beleza é estonteante. E a sensação é de estar praticamente dentro das árvores. São dezenas da espécie Ficus Microcarpa, que com seus longos e centenários galhos, fazem com que uma sombra confortante tome conta de toda a extensão da avenida. Sorte de quem tem um tempinho para parar, andar e respirar por esse lugar. Simplesmente para contemplar a beleza da Via da Saudade.

Foto: Arquivo Público e Histórico de Rio Claro

De acordo com a arquiteta e urbanista Mônica Frandi Ferreira, superintendente do Arquivo Público e Histórico de Rio Claro, pelas suas características formais, a Via da Saudade destaca-se do conjunto de ruas da região pelo paisagismo de suas árvores enfileiradas, que lhe conferem uma estética peculiar.

“Na questão funcional é uma avenida com começo e fim, que conduz o usuário da Rua 8 até a entrada do Cemitério Municipal, em duas faixas ladeadas por afastamento maior que o tradicional, distanciando as construções laterais, talvez sugerindo previsão de alargamento”, explica.

De alguns anos para cá, porém, a população tem percebido que algumas mudanças estão acontecendo. Árvores estão sendo removidas e chamam a atenção de quem passa pela via. O trecho entre a Rua 14 e a Rua 13, por exemplo, só conta atualmente com apenas duas grandes espécimes. As demais, foram removidas recentemente por estarem secas e colocarem em risco a segurança das pessoas, segundo a Prefeitura.

Nos últimos dias, a Câmara Municipal aprovou um requerimento de autoria do vereador Rafael Andreeta que questiona essas remoções das árvores e cobra para que, diante da compensação ambiental, sejam plantadas mudas maiores para que não se espere muito tempo para o crescimento.

Campanha pela web

Paulinha Cesar, fotógrafa, é uma das maiores defensoras da Avenida da Saudade. Em suas redes sociais, está sempre alertando e questionando os cortes realizados. “Estou em Rio Claro há 30 anos e me apaixonei pela Avenida. Todas as cidades por onde passei não existe uma avenida tão maravilhosa quanto a Da Saudade. O que estamos reparando é que as árvores estão ficando escassas. De uns anos para cá, vimos muitos cortes. Eu mesma já fiz vários vídeos cortando. Já cheguei a pedir laudos. É muito triste”, diz.

Bastante engajada, a profissional faz uma cobrança à Unesp para que se atente e “fiscalize” a avenida através dos cursos de Biologia e Ecologia, além da própria comunidade. “Eu procuro através das minhas redes sociais passar um pouco da mensagem, uma maneira de fazer a minha parte. A população tem que se unir mais, o poder está em nossas mãos, e cobrar do poder público uma atitude”, completa.

Tradição e turismo

O Senhor Marinho, comerciante que tem sua tradicional pizzaria Jangada há mais de 40 anos no trecho, lembra que seus clientes ficam maravilhados com a Avenida da Saudade. “Talvez o pessoal de Rio Claro, como já está acostumado, talvez não repare muito, mas para quem é de fora é um ponto turístico. A avenida é uma das mais lindas do interior de São Paulo, e nesses 31 anos que estou aqui a gente viu melhorias, modificações. Mas ultimamente achamos que tem ficado um pouco descuidada”, diz.

Para ele, há necessidades de melhor iluminação no trecho e atenção também com relação aos cortes das árvores. “A gente sabe que têm árvores que adoecem e precisam de poda, mesmo por que são centenárias. O que discordo é podar e não fazer um replantio de acordo. Tem que replantar alguma coisa que dê sentido à Avenida da Saudade”, opina.

O que diz a atual gestão

O secretário de Serviços Públicos, Ronald Teixeira Penteado, lembra que nesta nova administração ações de manutenção e zeladoria estão sendo realizadas na extensão da Avenida da Saudade e nas praças que compõem o trecho.

“Desde o corte de mato, a varrição, a limpeza, a poda de árvores e até a supressão total caso seja necessário. Todo pedido passa pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente, onde técnicos avaliam a real necessidade seja de uma poda ou a retirada total da espécie para que após a emissão do laudo chega para nossa Secretaria para fazermos a programação dessa retirada”, explica.

Diante da necessidade da retirada das árvores, a Prefeitura de Rio Claro faz replantios para a compensação ambiental. “Com certeza temos um carinho especial, pois é uma área tradicional, importante da cidade, onde tem toda uma história e tradição”, afirma Ronald.

DEBAIXO DOS BRAÇOS DO CRISTO REDENTOR

Foi em janeiro de 2016 que um grupo de amigos – apaixonados pela Avenida da Saudade – resolveu criar uma das atrações carnavalescas mais autênticas de Rio Claro, o Bloco da Saudade. Nascendo já icônico, tornou-se desde então a principal tradição da última quinta-feira antes do início do Carnaval rio-clarense.

“O Bloco da Saudade surge quando acaba o Bloco do Veneno. Numa conversa com Leonel, Nuno e Henrique, eles resolvem desfilar, brincar e fazer uma concentração ‘debaixo do sovaco do Cristo’. De lá para cá, vem ganhando adeptos. Não há regras para o Bloco, só não pode deixar entrar a tristeza e quando ela entra não tem espaço”, lembra Ari Rios, um dos organizadores da folia em plena Avenida da Saudade.

A concentração, como ele comenta, se inicia na Rua 8, debaixo dos braços do Cristo Redentor, e segue até a esquina da praça defronte ao Cemitério Municipal ‘São João Batista’, onde termina na quadra da escola de samba Grasifs – Voz do Morro.

O Bloco da Saudade começou com um carrinho de feira puxando o som aos foliões e se modernizou para atravessar a tradicional Avenida. “Devido a quantidade de pessoas, tivemos que locar uma perua de som, quem sabe um dia um caminhão de som”, pontua. Para Ari, a relação das pessoas que participam do Bloco com a própria via mudou.

“Uma coisa é andar olhando para o chão, todo mundo no celular, mas quando você para numa avenida como essa, começa a olhar as árvores e o final dela, que é o Cemitério, ou começo dela no Cristo, vê que é uma avenida diferenciada”, finaliza.

Foto: Clara Belchior

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