CAROLINA LINHARES – SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Por 48 votos a 37, a Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou na madrugada desta quarta-feira (14) o texto principal do projeto de reforma administrativa e ajuste fiscal proposto pelo governador João Doria (PSDB), que extingue órgãos públicos e retira isenções do ICMS.
Depois de enfrentar oposição à esquerda e à direita com sucessivas derrotas no plenário, Doria foi obrigado a recuar e a modificar pontos do projeto. Os trechos destacados, que devem poupar quatro entidades de extinção e preservar o caixa das universidades, ainda serão votados.
A proposta visa cobrir o rombo de R$ 10,4 bilhões causado pela pandemia do coronavírus.
Como mostrou a Folha, a tramitação do projeto virou tema da eleição municipal em São Paulo. Partidos da base do governo Doria, como MDB e DEM, que também compõem a coligação do prefeito Bruno Covas (PSDB) à reeleição, votaram a favor.
O projeto teve oposição dos deputados estaduais e candidatos à prefeitura Marina Helou (Rede) e Arthur do Val (Patriota), além do voto contrário das bancadas do PT, PSOL, PC do B e de parte do PSL, que lançaram seus candidatos à prefeitura -Jilmar Tatto (PT), Guilherme Boulos (PSOL), Orlando Silva (PC do B) e Joice Hasselmann (PSL).
Deputados bolsonaristas, como Gil Diniz (sem partido) e Douglas Garcia (PTB), também votaram contra. Em São Paulo, o presidente Jair Bolsonaro, que considera Doria um inimigo político, apoia Celso Russomanno (Republicanos) para a prefeitura -mas o Republicanos compõe a base de governo do tucano e, em sua maioria, votou a favor do projeto.
Horas antes da votação, em entrevista à BandNews, Russomanno afirmou ser contrário ao projeto de Doria, mas não comentou o fato de o Republicanos ser a favor.
“Inclusive o Governo do Estado agora tenta aumentar os impostos disfarçadamente aumentando o ICMS através de um projeto. […] O governador tenta agora aumentar os impostos para suprir a deficiência que ele mesmo causou”, disse.
O PTB, que ocupa a vice na chapa de Russomanno, votou em sua maioria contra o projeto.
Outros deputados envolvidos nas eleições também votaram contra. É o caso de Caio França (PSB), filho do candidato Márcio França (PSB), crítico de Doria. Parte do PSB, porém, votou a favor.
A bancada do PSD, que compõe a base de Doria, também rachou: Marta Costa (PSD) foi contrária ao projeto. Ela é candidata a vice na chapa de Andrea Matarazzo (PSD).
O projeto de Doria, um dos mais importantes e polêmicos de sua gestão, foi apresentado à Assembleia no dia 13 de agosto. Inicialmente, a proposta abarcava uma série de temas, como aumento de impostos, uso da verba da Fapesp e das universidades estaduais e extinção de dez órgãos públicos. No plenário, a matéria sofreu sete derrotas consecutivas, com deputados derrubando as sessões por falta de quórum.
Como mostrou o Painel, deputados relataram a oferta pelo governo de R$ 20 milhões em emendas para quem votasse favoravelmente.Mas o texto extenso e com temas diversos trazia pontos que desagradavam a esquerda petista, a direita bolsonarista, deputados do Novo e mesmo deputados da base –a questão eleitoral inflamou ainda mais a questão.
Por fim, o governo cedeu em diversos pontos e alcançou maioria. A deputada Janaina Paschoal (PSL), por exemplo, passou a votar a favor com a nova redação.
Doria abriu mão de extinguir a Fundação para o Remédio Popular (Furp), a Fundação Oncocentro (Fosp), o Instituto de Medicina Social e de Criminologia (Imesc) e a Fundação Instituto de Terras (Itesp); preservou os fundos da Fapesp, das universidades e da segurança pública; e desistiu das novas regras do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos).
Os trechos do projeto que garantem tais mudanças, porém, ainda serão votados.
Foram extintos, porém, a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos (EMTU), a Superintendência de Controle de Endemias (Sucen), a Fundação Parque Zoológico e o Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo (Daesp).
Parte dos aliados de Covas viu um erro de Doria em enviar à Assembleia temas impopulares durante o período eleitoral. Membros de sua campanha, no entanto, avaliaram que a imagem do prefeito não foi contaminada pelo projeto do governador.
Deputados do Republicanos também minimizaram o efeito da sua votação favorável ao projeto entre os eleitores de Russomanno, que costumam ser simpáticos a Bolsonaro e contrários a Doria.
O PL 529 chegou a ser tema de pergunta a Arthur e Marina feita no debate da TV Bandeirantes, em 1º de outubro. Arthur disse ser contra o projeto pelo aumento de impostos, e Marina argumentou que o texto desrespeitava o Legislativo.
Cada derrota de Doria em plenário foi transmitida ao vivo nas redes sociais dos deputados, inclusive por Arthur, candidato influencer.”Hoje você derrotou o Doria, parabéns. […] É candidato a prefeito de São Paulo”, diz Conte Lopes (Progressistas) a Arthur na transmissão da votação de 30 de setembro, quando não houve quórum para a aprovação.
O candidato do Patriota então mostra deputados da base do governo derrotados. “Ali está o Republicanos, partido do Russomanno.””A Marina Helou é candidata também a prefeita. Hoje você também derrotou o Doria”, diz Arthur à candidata da Rede.