SYLVIA COLOMBO – BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS)
O velório de Diego Armando Maradona na Casa Rosada, sede do governo argentino, é palco de muitas homenagens e despedidas emocionadas para o ídolo, mas também de caos ao longo desta quinta-feira (26).
O horário inicial da cerimônia, inicialmente prevista para terminar as 16h, foi estendido até as 19h, diante da massa de fãs que aguardavam na fila por horas e não conseguiriam se despedir do craque na programação original.
Pouco depois desse anúncio, porém, a visitação foi interrompida, e o caixão com o corpo dele, retirado do local onde estava exposto.
O ex-jogador morreu aos 60 anos na quarta (25), em casa, quando se recuperava de uma cirurgia na cabeça. A causa ainda não foi confirmada.
Em meio à pandemia de Covid-19, mais de 1 milhão de pessoas eram esperadas para o evento público. Milhares já aguardavam para entrar na Casa Rosada às 6h desta quinta, quando as portas do edifício histórico se abriram para receber os fãs.
As tentativas de manter o distanciamento social por conta da pandemia e a organização da entrada dos admiradores fracassaram logo de cara. Havia grades de metal para tentar conter o volume de gente, mas elas eram constantemente derrubadas, porque alguns queriam passar adiante dos outros.
Muitos desses torcedores haviam passado a noite entre o Obelisco e a Praça de Maio, onde foram realizadas as homenagens na quarta, e vários estavam embriagados.
Com esforço, seguranças conseguiam convencer que alguns pelo menos colocassem a camiseta e a máscara antes de entrar no recinto.
À tarde, a situação piorou. Apesar da fila de mais de dez quarteirões para ver Maradona, os organizadores interromperam a entrada de mais gente a partir das 15h.
Até o local do velório, os torcedores tinha de ficar três horas ao sol, entre duas linhas de placas de metal. Concluiu-se que não haveria tempo para que o corpo deixasse o local entre 16h30 e 17h, que era o combinado entre a Presidência e a família do ex-jogador.
Começou, então, a haver correria e revolta entre os presentes quando informados de que muitos deles não chegariam perto do ídolo.
A polícia interveio com gás lacrimogêneo e tiros de bala de borracha, principalmente na entrada da Praça de Maio, e perto das cercas da Casa Rosada.
“Diego é do povo! Deixem-nos entrar”, gritavam. Muitos não usavam máscaras de proteção, ou as usavam de forma errada, caídas no queixo. Não havia distanciamento nem controle por parte das autoridades para as medidas sanitárias básicas.
Após alguns manifestantes conseguirem pular para a Casa Rosada, o governo anunciou que o velório se estenderia até as 19h.
Quando isso foi divulgado, porém, a fila já se havia desfeito. Muitas pessoas estavam espalhadas pela praça. Alguns torcedores conseguiram entrar pulando no local pela parte de trás do edifício.
Funcionários do governo, atrapalhados, tentavam reorganizar uma fila do zero, entre cidadãos que cooperavam e outros que não queriam obedecer e tentavam forçar a entrada, sem respeitar ordem de chegada.
Às 15h30, um novo grupo de torcedores, mais numeroso, entrou à força no pátio interno da Casa Rosada, o que levou a polícia a atirar novamente gás lacrimogêneo.
Os organizadores do evento decidiram, por segurança, remover o caixão com o corpo de Maradona do local, o que causou mais gritaria entre os torcedores.
Até então, o lado de dentro era bem mais controlado. O caixão estava fechado e a princípio coberto com uma camiseta da Argentina de número 10 e outra do Boca Juniors.
As pessoas passavam rapidamente diante dele e gritavam: “Obrigada, Diego”, “Você é Deus”, além de jogarem camisetas de vários times, terços, flores e outros objetos.
Pouco antes de abrir as portas para a multidão que já estava na Praça de Maio desde o dia anterior, a família do ídolo se despediu dele numa cerimônia privada, à qual os jornalistas não tiveram acesso.
Estavam presentes sua ex-mulher, Claudia Villafañe, suas filhas mais velhas, Dalma e Giannina, e também sua companheira mais recente, Veronica Ojeda, com o filho mais novo, Dieguito Fernando, além da outra filha do ex-jogador, Jana Maradona. Apenas um dos filhos reconhecidos, Diego Júnior, não compareceu, por estar na Itália, em tratamento médico por conta do coronavírus.
Também apareceram ex-jogadores que foram companheiros de Maradona -Oscar Ruggeri, Sergio Batista e Jorge Burruchaga- e alguns ídolos argentinos mais recentes, como Carlos Tévez, Martín Palermo e Javier Mascherano.
O presidente argentino, Alberto Fernández, chegou à Casa Rosada de helicóptero no fim da manhã. Com os olhos marejados, caminhou até as grades que o separavam dos torcedores e tirou selfies. Já dentro da sede do governo, se aproximou do caixão e deixou sobre ele uma camiseta 10 do Argentinos Juniors, time do qual é torcedor e onde Maradona iniciou sua carreira.
Fernández também pôs ali um lenço das Mães da Praça de Maio, organização de direitos humanos que busca os desaparecidos da ditadura militar (1976-1983) e com quem Maradona tinha forte vínculo. Houve um minuto de silêncio e cumprimentos do presidente à Claudia Villafañe, Dalma e Giannina.
A bandeira argentina localizada no meio da Praça de Maio está a meio-pau. Fernández decretou na quarta-feira luto oficial de três dias.
Depois da cerimônia na Casa Rosada, o corpo será levado ao cemitério de Bella Vista.