Aos 63 anos, professora de inglês Marina de Araújo Brito Buttros, conta como vivencia a maturidade e a luta por saúde, em meio a um jardim que lhe devolveu a paz de espírito
Marina Buttros, de 63 anos, ama o seu jardim, construído no fundo de casa, no Jardim São Paulo. Ela jura que ele é encantado e que ela própria já viu sumir muitas coisas ali, como: a irritação, a falta de esperança, a pressa e tantas outras.
Esse jardim ela o fez com suas próprias mãos e tem um pouco de tudo: podocarpo, rosas, lavanda, primavera, begônia, cactos, e muito mais. De joelho no chão, a professora arrancou todo o mato que ali estava. As plantas que hoje tocam o céu, eram simples bebês. Como constatou o JC, é muito claro em seus olhos o imenso valor que este jardim tem em sua vida.
Num dia, assim como outro qualquer, ela resolveu ir ao médico, pois seu braço esquerdo estava tenso causando muita dor ao final de um dia de trabalho. Essa era sua única queixa. Entrou sala adentro alegre, leve, sorridente como era seu jeito comum de ser.
No entanto, ao sair, contou que seus olhos estavam pesados, tristes, para não dizer que eles pareciam ter perdido a vida naqueles poucos minutos em que estivera lá dentro.
Ela entrou só, mas saiu acompanhada de uma pessoa que se apaixonou por ela e que jurou estar ao seu lado para o resto da vida. Seu nome? James Parkinson – se referindo ao Mal de Parkinson.
“No início desse relacionamento ele parecia ser muito maior do que eu, dominador e por vezes carrasco. Morria de medo dele. O brilho de meu olhar, a alegria que me era típica foram arrancados sem dó nem piedade”, relembra.
Com a notícia, começou a substituir folhagens e pés de flores naturais por outros, de plástico. Na época, ela mesma não compreendia o porquê dessa troca. O entendimento veio depois: às voltas com graves problemas de saúde, ela se desfazia das plantas de verdade na medida em que sua esperança de recuperação ia se esvaindo.
A terapia ocupacional a ajudou a recuperar a vontade de viver e de ter vida ao seu redor e, então, ela voltou a optar por plantas naturais. Marina sofre do Mal de Parkinson, diagnosticado há 12 anos, e garante: seu jardim é ‘mágico’ e a ajuda a recarregar o corpo e a alma com energia positiva.
“Eu cuido desse jardim todos os dias, mas, quando posso, fico horas mesmo, cuidando dele. Tudo aqui foi plantado e cultivado por mim, aqui eu me sento toda noite para ver a lua e as estrelas, agradeço por todas as bênçãos do dia e até acabei dormindo aqui até o dia clarear”, conta. “Aquela falta de esperança que eu sentia era o breu. A morte em vida”, acrescenta.
Transformação
A doença, a luta para viver e a maturidade a transformaram – para melhor, garante Marina. “A minha maturidade me traz serenidade para aceitar as coisas que não posso mudar, a coragem para mudar as que posso e a sabedoria para saber a diferença entre elas”, reflete. “Traz, também, o desprendimento material e das pessoas, me deixando mais próxima da minha liberdade, da liberdade do meu espírito, que se recusa a deixar de ser jovem”, afirma.
Ela vai além. “Decidi que não ‘sou’ doente, mas sim que ‘estou’ com uma doença, o que é bem diferente. Não tenho medo de nada, só de camundongos (risos). Hoje só convivo com amigos verdadeiros, canto e ouço música, escrevo textos e os publico, adoro poesias. As declamo e as pessoas gostam de me ouvir. Não tenho também problemas por saberem da minha doença, pelo contrário, sinto orgulho”, diz.
Vida preenchida
Declarando ter dedicado sua vida há muito tempo a Deus, direcionando a Ele todos os seus pensamentos, sentimentos e ações, Marina diz que também renova suas energias preenchendo sua existência com o que mais ama. Além da música e da poesia, ama saltar de paraquedas.
Ela diz que lê muito, tendo entre seus escritores prediletos Khalil Gibran, Saint Exupèry, Clarice Lispector, Augusto Branco, Machado de Assis, Fernando Pessoa e Khaled Hosseini. A pintura também lhe atrai e se diz fã da iraniana Iman Maleki.
Com todo o aprendizado e evolução vivenciadas nos últimos anos, Marina tem hoje uma autodefinição muito clara. “Hoje eu sei que sou Fênix”, diz, referindo-se ao pássaro lendário da mitologia grega. “Posso virar cinzas, mas renasço. Um amigo querido já me disse: ‘Marina, você não cai. Apenas se ajoelha para alçar voo”.
Atualmente, a professora se gaba ao dizer que o que gosta mesmo é da queda livre. E seu companheiro J.P.? Foi embora, abandonou-a? Não. Ele continua ali, num cantinho de sua vida. No entanto, enfrenta uma doença sem cura e encontra no jardim onde cultiva não só folhagens e flores, mas, também, uma atitude de maturidade positiva, valorizando cada dia de vida, com gratidão e amor.