Folhapress
Um estudo clínico revelou que a alimentação com restrição de tempo, conhecida como jejum intermitente, é melhor para a perda de peso, mas não necessariamente para a diminuição da gordura. A prática, caracterizada pela alimentação em janelas de 10 ou menos horas seguida por jejum, também trouxe melhores resultados para a pressão arterial e o humor, quando comparada a um programa de alimentação de 12 horas ou mais.
Especialistas, entretanto, dividem-se quanto aos reais benefícios deste tipo de dieta.
Realizado com 90 pessoas obesas entre 25 e 75 anos, o trabalho desenvolvido na Universidade do Alabama em Birmingham, nos Estados Unidos, apontou que os pacientes que fizeram o jejum tiveram uma perda de peso de 2,3 kg a mais do que o grupo de controle.
Não foi identificada, entretanto, perda de gordura total significativa, ainda que, em uma análise secundária, os dados tenham indicado diminuição segmentar de gordura na região do abdômen.
O estudo clínico não deixa claro como ocorreu a diminuição do peso, já que não houve variação da gordura corporal. Segundo especialistas, o emagrecimento pode ser reflexo de variáveis como a hidratação ou alterações hormonais. De acordo com a pesquisa, também não houve perda significativa de massa magra, ainda que estudos anteriores apontem que essa possa ser uma limitação da dieta.
A endocrinologista do Hospital Mater Dei de Belo Horizonte Patrícia Corradi afirma que não há consenso científico sobre o papel da alimentação com restrição de tempo na perda de peso. Segundo ela, a variedade de estudos disponíveis, feitos com parâmetros diferentes, gera resultados diversos.
“Não existe nenhuma indicação do jejum como uma estratégia de emagrecimento nas principais recomendações. O que a gente tem são alguns benefícios metabólicos, como a resistência insulínica”, diz.
Ainda assim, para a endocrinologista, vale a pena apostar nesse tipo de programa alimentar se o paciente se adaptar bem à prática. “É uma forma de induzir o déficit calórico a partir da restrição do número de refeições, sendo que essas refeições precisam necessariamente ter o número de calorias controladas.”
Todos os participantes da pesquisa, publicada no início de agosto na revista JAMA Internal Medicine, foram orientados a fazer atividade física e a ter uma dieta hipocalórica, com 500 calorias a menos do que a sua taxa metabólica em repouso.
O estudo foi feito em 14 semanas e 80% dos pacientes eram mulheres. A janela de consumo do grupo que fez o jejum intermitente foi entre 7h e 15h. Isso quer dizer que, antes ou após esse horário, os participantes não poderiam comer.
“Há um outro estudo que foi publicado no The New England Journal of Medicine que teve mais ou menos essa mesma proposta, mas com um ano de duração. Ele não mostrou esse benefício com relação ao emagrecimento”, diz Corradi. “Essa é uma sinalização de que essa estratégia pode ser utilizada dentro de uma periodização”, afirma a endocrinologista, ao explicar que o jejum pode ser adotado por temporadas, interrompendo a prática antes que o corpo se acostume e a estratégia se torne menos eficaz.
O estudo da Universidade do Alabama também apontou melhora da pressão arterial diastólica no grupo que praticou o jejum. O humor, aferido por questionário entregue aos pacientes, também teve alterações, que se manifestaram na diminuição da fadiga e aumento da vitalidade.
A nutricionista Gisele Magalhães, participante do Janela da Escuta, programa de extensão e pesquisa da Faculdade de Medicina da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), defende que alimentação saudável com poucos industrializados e sem agrotóxicos, exercício físico, água e uma boa noite de sono, são os melhores hábitos para um dia a dia mais saudável.
“Quando a gente entra em jejum, muitas vezes não conseguimos ficar sem se alimentar por mais tempo, só que, na hora de comer, podemos perder o controle, o que não é saudável. A conclusão é que aquele velho e bom caminho das pedras dos hábitos saudáveis é o melhor. Não tem ainda uma fórmula mágica.”
A nutricionista alerta que o jejum intermitente pode ser gatilho para transtornos alimentares, além de poder causar hipoglicemia, queda de pressão arterial e perda de musculatura e água, dentre outros problemas. Magalhães também reforça que esse tipo de dieta não deve ser feito por crianças e adolescentes, que precisam do consumo regular de alimentos para garantir o desenvolvimento cognitivo.
“O risco é maior do que o benefício. Uma coisa é a gente ter uma pesquisa com as pessoas monitoradas. Outra é você estar no seu dia a dia, fazendo jejum e, de repente, num calor de 40 graus, desmaiar porque está só bebendo água. Acho que os riscos são maiores do que os benefícios”, afirma.
Segundo ela, respeitar a própria fome na hora de escolher o horário das refeições e seguir as orientações do Guia Alimentar para a População Brasileira, documento do Ministério da Saúde que reúne diretrizes de alimentação adequada, são medidas práticas e eficazes para uma vida saudável e para o emagrecimento.
“Em geral, quando a gente respeita a nossa fome, a gente também tem uma melhora na resposta da perda ou do não ganho de peso.”