Era pouco mais de 18h30 quando o pastor Gustavo da Costa se dirigia até a igreja do Nazareno, no bairro Jardim Centenário, quarteirão vizinho ao posto de combustíveis, cenário da tragédia que causou pânico em Rio Claro. O teto caiu sobre o altar no momento em que parte da banda ajustava o som para começar o culto, há dez dias. Era noite fria de quarta-feira, 30 de junho. Às margens da Rodovia Washington Luís havia muita fumaça e fogo. O trânsito parava.
Uma alta nuvem de medo pairava sobre Rio Claro. A explosão de um caminhão no posto de combustíveis, que deixou 22 feridos e uma vítima fatal, ainda é comentada na cidade. Nesta edição, o JC traz, na ‘Reportagem da Semana’, histórias de vizinhos que se recordam dos momentos de pânico que passaram e mostram as dimensões da tragédia.
O pastor Gustavo é só um entre as dezenas de pessoas que foram atingidas pelo desastre que, dez dias depois, ainda traz marcas. Ele relatou que teve dificuldades de chegar até a sede da igreja.
“Tinha muitas pessoas nas ruas. Os policiais não me deixavam passar porque diziam que o posto estava explodindo. Eu expliquei a eles que precisava chegar, pois recebi uma ligação de que tudo havia desabado. Ao adentrar, pude observar a situação. Era algo que nunca presenciamos durante quase oito anos de caminhada neste bairro”, comentou.
Gustavo contou que não pode ficar muito ali naquele momento, pois tudo era um caos e as autoridades falavam numa terceira explosão. “Pediram para a gente sair correndo sem pegar algumas coisas e desligar outras. Essa noite de caos ficará para a história da vizinhança. Diante de tudo o que aconteceu, o bairro teve um grande livramento. O culto estava prestes a começar e, na hora do ocorrido, tínhamos aqui três pessoas em cima do altar. Elas foram arremessadas ao chão no momento onde tudo desabava e não tiveram nenhum arranhão”, explicou.
Hoje o local de fé e oração dá lugar a poeira e sujeira. Eles pensam, aos poucos, em retomar os cultos. Os encontros aconteciam às quartas-feiras e domingo de manhã e à noite. Os prejuízos são no forro do altar, que veio inteiro abaixo, telhas, vidraças e portões.
“Estamos estruturando para não oferecer riscos. A Defesa Civil liberou o local, pois a estrutura de alvenaria não foi danificada. Diante daquilo que vivemos e passamos, estamos devagar tentando retomar a nossa vida. O período será um caminho muito longo para restaurarmos todas as áreas afetadas”, relatou.
‘Pensei que estava acabando o mundo’
Durante a explosão, as famílias de dona Giani Aparecida Ramos, de 53 anos, e da filha que mora nos fundos, Neli Valéria Soares, de 36, também sofreram prejuízos. A onda de choque destruiu parte do telhado, forro, janelas e vidraças. Além disso, rachaduras aparecem em várias partes do imóvel.
“Pensei que estava acabando o mundo. Não tinha para onde correr. Tudo estava vindo abaixo. Graças a Deus estamos vivos. O problema é que, sem emprego, não tenho condições de arrumar os estragos, que foram grandes. Está muito frio. As janelas que ficaram estão sem os vidros e as que caíram fazem entrar muito vento. Preciso de ajuda”.
Desempregada há sete meses por conta da pandemia, dona Giani mora no bairro há quase dez anos. Antes trabalhava como empregada doméstica e até tinha dinheiro para emergências. Agora, ficou sem nada. Só recebe os R$ 150 do Auxílio Emergencial. Ou seja, ela precisa de doações para refazer a área da casa atingida.
A empregada doméstica conta que a prefeitura de Rio Claro, por meio da Defesa Civil, chegou a vistoriar o imóvel, mas que eles perderam as fotos do dia da explosão.
“Eles entraram e tiraram fotos. No outro dia vieram de novo e disseram que perderam [as imagens]. Mas se tudo foi perdido na hora em que aconteceu, as fotos de agora não vão adiantar muito, pois fizemos uma ‘gambiarra’ e colocamos muita coisa de volta. Nós precisamos de ajuda”, ressaltou.
Também desempregada por conta da pandemia, a filha de dona Giani, que fazia faxina em uma casa, disse estar desesperada, pois a família carente quase não tem renda para comer, muito menos para arcar com os gastos da tragédia.
“Quem puder doar telhas, janelas, vidraças, será de bom agrado. Estamos necessitando. Estamos sem emprego. Ninguém veio nos oferecer ajuda. Nem o prefeito, nem os vereadores. Onde está o prefeito Gustavo [Perissinotto] para nos oferecer ajuda nesse momento? Que Deus toque no coração de cada família que lê essa reportagem, para que venha nos ajudar. Estamos vivendo só com o dinheiro do Auxílio. Como tenho dois filhos, um de 12 e outro de 13 anos, fica muito difícil. Qualquer ajuda é bem-vinda, inclusive de cestas básicas”, pediu Neli.
A casa de dona Giani e da filha fica na Avenida 6, número 70, no Jardim Centenário, em frente à caixa d’água. Para falar com elas é só ligar: (19) 97158-4073.
24 imóveis foram vistoriados, diz Defesa Civil
Segundo a Defesa Civil, os rio-clarenses lidaram com o tremor causado pelo impacto a 2,5 quilômetros. O órgão disse que o barulho pode ser ouvido a 15 quilômetros do local. O balanço, até agora, é de 24 propriedades vistoriadas.
“Nenhuma dessas construções sofreram danos severos que justificassem a interdição dos imóveis, apenas a manutenção das áreas afetadas. Finalizamos os atendimentos orientando os solicitantes da necessidade de contratação de profissionais habilitados para a recuperação das áreas afetadas, e em caso de acionamento de seguro, seguir os protocolos do contrato com a apresentação de laudos oficiais assinados por profissionais habilitadas da área”, diz nota do órgão enviada ao JC.
Já a polícia informou que foram registrados cerca de 50 boletins de ocorrência por danos materiais de casas e comércios que ficam nas proximidades do posto.
A polícia segue ouvindo testemunhas e os responsáveis pelo caminhão. O motorista deve ser ouvido após ter alta hospitalar.